segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Tipos de leitor e de escritor netianos

Tipos de leitor e de escritor netianos

Tipos de leitor:
Leitor óbvio - só diz o óbvio do óbvio. Ainda bem que se expressa laconicamente...


Leitor grato - lê, em geral com atenção, a produção do escritor visitado. E indefectivelmente agradece a sua visita.


Leitor dissimulado - assegura que leu a produção e a achou boa, mas objetiva mesmo convidar o escritor visitado a "passar pela sua escrivaninha, se tiver um tempo, pois escreveu algo semelhante ao trabalho lido, etc. etc..."

Leitor apenas - esse tipo passa pela escrivaninha realmente apenas para ler a produção alheia. E em geral declara isto. Mas só, sem aprofundamentos de opinião.

Leitor real - esse lê, relê, trelê o texto, produzindo uma reflexão compatível e convincente com o que leu. Não costuma economizar palavras, embora elogie sempre.

Leitor crítico - praticamente inexistente. E se ou quando existe, é monitorado, execrado, perseguido e ridicularizado no terceiro ou quarto comentário.

O leitor crítico não tem de ser especialista em nada: basta-lhe ler e criticar, falando bem ou mal --- mas sempre com ética, seriedade, desenvoltura, amor ao que faz. Cabem aí também a paixão, a indignação e a emoção.

Isso derruba um dos argumentos perenes dos analisados e seus defensores: de que, para criticar, o leitor tem que ter atributos e conhecimentos amplos e específicos sobre o assunto.

Tipos de escritor (quanto à crítica):
1 – Humildes
2 – Tolerantes
3 – Intolerantes.

Só não há escritor indiferente, já que as críticas representam comentários à sua obra; e ele fez-se escritor exatamente para isto: ser lido e saber que é lido --- ainda que apenas pelos frequentadores da esfera de atividade humana a que dirige seu discurso. Essa esfera tem também o nome de ambiente social de produção, circulação e recepção dos gêneros textuais.

Nota: Este assunto se acha desenvolvido no artigo "Comentando Comentários".


Novamente agradeço a sua leitura e suas possíveis correções, de qualquer natureza!

domingo, 24 de agosto de 2008

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Ziraldo: glória aleatória

Os escritores medianos ou medíocres possuem méritos, sim: dão velocidade de leitura ao público infanto-juvenil, isto é, sua fama e facilidade de compreensão fazem esse público começar por eles, nutrir-se deles e, previsivelmente, passar no futuro a obras mais difíceis, complexas, profundas e reelaboradas --- florestas e não jardins.

O superficial e supérfluo Ziraldo, por exemplo. Seu “best-sellerismo” deriva de razões de mercado e de culto a ícones mancos, a cânones duvidosos que o tempo, senhor das nossas ânsias fugazes, reduzirá a nada.

domingo, 20 de julho de 2008

Bisa Bia, Bisa Bel (novela), de Ana Maria Machado (resenha)

Apresentação:
A narrativa ocorre do ponto de vista da narradora-protagonista, a pré-adolescente Isabel Miranda. Menina de classe média, com seus dez anos, ela discorre sobre o seu mundo: o lar, a escola, os amigos, as travessuras. A mãe, a "bisavó" e a "neta", além da professora Sonia, procuram compreendê-la e auxiliá-la nessa travessia para a puberdade.



Abordagem crítica:
Os doces segredos afloram suavemente, num relato comovente, fluindo em reflexões feitas de ternura, surpresas e lembranças. Sem sombras sequer de pieguices.
A sua nem-sonhada bisavó vira personagem do cotidiano, através de um retrato antigo, que a menina leva para a escola, os passeios, brincadeiras de rua e inesperados diálogos íntimos.
A garota redescobre e recupera o passado, redimensiona o futuro e aprende a conviver consigo mesma, no presente. Sem sair do presente.
O tempo, que promove o encontro das gerações, simboliza um desfile de descobertas, unindo passado/presente/futuro em experiências, conflitos, renúncias, conquistas e amadurecimento.



Ouvindo fadas...
Em Bisa, as vozes do exílio, da utopia e do imaginário discutem, com tênue delicadeza, os comportamentos, as questões existenciais, os ritos de passagem de menina a moça --- tudo isto envolto em intenso e imenso clima lírico. Auroras que desabrocham, acordadas por múltiplas vozes interiores.
Fantasia e realidade, sonho e terra firme, ficção e não-ficção dialogam continuamente em Bisa, questionando os papéis sociais, os hábitos, costumes e valores --- tanto ideais quanto os já vigentes.



Escritura ou relação forma-conteúdo:
Total ausência de desvios da norma culta, de lugares-comuns ou fraqueza narrativa. Uma linguagem construída sem beletrismo, rebuscamentos, tropeços ou armadilhas estilísticas. Todavia com rigoroso cuidado linguístico, ênfase e sensibilidade artística. O monumento da fala sobre o pedestal da língua. Numa palavra: canônica.
O livro, obra maior de uma das nossas escritoras essenciais, chegou sem dúvida para ficar, refulgir e encantar.

Entretanto...
O leitor crítico adora perder uma chance de ficar calado. Então, falamos: há nessa diminuta novela milhares, talvez milhões de verbos 'ter'. Igualmente, disputam os nossos olhos outros milhões de 'ser'. Afora os infinitos 'estar'... Que empobrecimento ilícito!
E, mais para o final, uma ou duas cenas nojentas, de limpar-o-nariz-sem-lenço e gozações a respeito... Que lixo!




Aspectos técnicos:
As ilustrações de Regina Yolanda não correspondem, em beleza e qualidade, a tão singela história. Trata-se de desenhos desleixados, sem originalidade e mal-feitos (referimo-nos às figuras humanas).
Bons, o tamanho dos tipos e a qualidade da impressão. Revisão técnica caprichada. Capa muito bonita.



"Bisa Bia, Bisa Bel" (novela), de Ana Maria Machado. Capa: Luiz Fernando Rudio. Ilustrações: Regina Yolanda. 56p., 36ª ed. RJ, Salamandra, 1998.


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Curso: Pós-Graduação em Literatura Infantil e Juvenil – UFRJ
Módulo: "O Cânone Contemporâneo", ministrado pela Profª Drª Ana Crelia Dias.

sábado, 19 de julho de 2008

Sites sobre resenhas

Sites pesquisados por Jô:
http://www.fnlij.org.br/ -
- "PNDE": uma imensa ordem alfabética (de títulos), com resenhas;
- "Links recomendados": 17 links para sites de entidades e escritores.

www.bibvirt.futuro.usp.br/
- "Literatura": posso buscar por "Autor", "Gênero" ou "Título".
- "Links indicados": bem rico.

www.leialivro.sp.gov.br/texto
Tem o recurso de aumentar texto.
Tem "Resenhas" (Ficção, Não-ficção e Infantil) --- amadoras, é verdade.

http://roedoresdelivros.blogspot.com/2006/
milu-leite-pergunta-e-as-obras-infanto.html
(Além de outras vantagens, abre links para um monte de autores infantis e sites afins)

http://www.lendo.org/

http://www.roseanamurray.com/


Sites indicados por Georgina e Luiz Henrique:
http://www.dobrasdaleitura.com/
http://www.educação.uol.com.br/
http://www.eraumavez.com.br/
http://www.sitesnobrasil.com/
http://www.sobresites.com/

Notícias de livros infanto-juvenis lidos em 2008

- "A Bolsa Amarela", de Lygia Bojunga Nunes. Il. Marie Louise Nery. 116 p., 17ª ed. Livraria Agir Editora, RJ, 1990.

- "A bruxinha atrapalhada", de Eva Furnari. Sem texto. Il. da autora. 32 p., 21ª ed. Global, SP, 1999.

- "A canção do exílio e outros poemas"(1), de Antonio Gonçalves Dias. Seleção e comentários de Ivo Barroso. Ilustrações: Gravuras do século XIX (supervisão de Ziraldo). 48 p., 1ª ed. Sem ind. editora, local e data.

- "A Divina Comédia", de Dante Alighieri. Adap. Luiz Galdino. Il. Constança Lucas. 80 p., 1ª ed. Escala Editora, SP, 2006.

- "A Fada Oriana", de Sophia de Mello Brayner. Il. Luís Noronha. 83 p., 3ª ed. Edições Ática, Lisboa, 1990.

- "A Metamorfose", de Franz Kafka. Trad. Cris Siqueira. Adap. e il. Peter Kuper. Conrad Ed. do Brasil, SP, 2004. Quadrinhos.

- "A mulher que matou os peixes", de Clarice Lispector. Il. Flor Opazo. 32 p. Ed. Rocco, RJ, 1999. - "A Redação", de Antonio Skármeta. Trad. Ana Maria Machado. Il. Alfonso Ruano. 36 p., 2ª ed. Record, RJ, 2006.

- "Abecedário de Millôr para crianças", de Millôr Fernandes. Imagens de Guto Martins e Susan Johnson. 44 p., 1ª ed. Nova Fronteira, SP, 2004.

- "Ali Babá e os quarenta ladrões", por Antoine Galland. Adap. Luc Lefort. Trad. Ruth Salles. Il. Emre Orhun. 48 p., 1ª ed. Ática, SP, 2002.

- "As aventuras de Pinóquio", de Carlo Collodi. Trad. Marina Colasanti. Apres. Tatiana Belinky. Il. Odilon Moraes. 64 p., 1ª ed. Companhia das Letrinhas, SP, 2002.

- "As Aventuras de Tom Sawyer"(1), de Mark Twain. Ilustrações de Pinky Wainer. Adaptação de Ruth Rocha. 72 p., 1ª ed. Editora Objetiva, RJ, 2003.

- "Aladim e a lâmpada maravilhosa". Adap. Eunice Braido. Il. Edil A.S. Araújo. 16 p. Ed. FTD.

- "Andira", de Rachel de Queiroz. Il. Suppa. 48 p., 5ª ed. Ed. Caramelo, SP, 2004.

- "Bisa Bia, Bisa Bel", de Ana Maria Machado. Capa: Il.: Regina Yolanda. 56p., 36ª ed. Salamandra, RJ, 1998.

- "Cachinhos de Ouro". Recontado por Ana Maria Machado. Il. Ellen Pestili. 32 p., 1ª ed. FTD, SP, 2004.

- "Contos de Enganar a Morte" (recontados por Ricardo Azevedo). Il. dele. 62 p., 1ª ed. Ática, SP, 2005.

- "Contos de Hoje e de Ontem" (antologia).

- "Contos tradicionais do Brasil para crianças", de Luís da Câmara Cascudo. 96 p., 2ª ed. Ática, SP, 2002.

- "Crônica de uma morte anunciada", de Gabriel García Márquez. Trad. Remy Gorga, filho. 178 p., 34ª ed. Record, RJ, 2006.

- "El-Rei Tadinho", de Alice Vieira. Il. Teresa Dias Coelho. 85 p., 11ª ed. Editorial Caminho, Lisboa, 1984.

- "Eu chovo, tu choves, ele chove (teatro), de Sylvia Orthoff. Il. Glenda Rubinstein. Apresentação de Ana Maria Machado. 64 p., 1ª ed. Editora Objetiva, RJ, 2001.

- "Feijãozinho 1, 2, 3", de Sheila Gomes e Lúcia Pimentel Góes. Il. Alexandre Delforge. 20 p. Ed. do Brasil, SP, 1985.

- "Finnício Riovém"(3). Adap. Donaldo Schüler. Baseado no romance "Finnegans Wake", de James Joyce. Il. Cristiane Löff. 128 p., 1ª ed. Lamparina editora, RJ, 2004.

- "Histórias Africanas para contar e recontar", de Rogério Andrade Barbosa. Il. Graça Lima. 48 p. Ed. do Brasil, SP, 2006.

- "Histórias Daqui e Dali" (antologia), de Joel Rufino dos Santos (org.).

- "Hoje tem espetáculo: no país dos prequetés" (teatro), de Ana Maria Machado. Il. Gerson Conforte. 52 p., 1ª ed. Nova Fronteira, RJ, 2001.

- "João e Maria". Adap. Alfredo C. Machado. Il. T. Izawa e S. Hijikata. 16 p. Ed. Record.

- "Nó na garganta" de Mirna Pinsky. Il. Ciça Fittipaldi. 74p., 43ª ed. Atual, SP, 1998.

- "Nossos Poetas Clássicos" (antologia poética), de Vania Maria Rezende (org.). Il. Graça Lima. Apresentação de Laura Sandroni. 48 p., 1ª ed. Editora Agir, RJ, 2003.

- "O Cavaleiro sem Espada", de Matilde Rosa Araújo. Il. Maia Keil. 30 p., 14ª ed. Porto Editora, Lisboa, 1995.

- "O corcunda de Notre-Dame", de Victor Marie Hugo. Adap. Telma Guimarães. Il. Denise Nascimento. 48 p., 1ª ed. Scipione, SP, 2003.

- "Odisséia"(4), de Homero. Il. Eduardo Rocha. Adap. Ruth Rocha. 96 p., 3ª ed. Companhia das Letrinhas, SP, 2000.

- "O Ex-Mágico", de Murilo Rubião. In: "Contos". Il. Angelo Abu. 82 p., 3ª ed. DCL, SP, 2006.

- "O Flautista Mágico". Sem ind. autor e adap. Il. Lima. Ed. Globo, SP, 2000.

- "O Menino Astronauta" (quadrinhos), de Ziraldo. Il. dele. 34 p., 2ª ed. Agência Espacial Brasileira, DF, 2003.

- "O menino da Lua", de Ziraldo Alves Pinto. 48 p., 2ª ed. Il. do autor. Melhoramentos, SP, 2006.

- "O menino e o arco-íris", de José Ribamar Ferreira Gullar. Il. Marcelo Apis. 102 p. Ed. Ática, SP, 2001.

- "O menino e o tuim", de Rubem Braga. Desenhos de Denise e Fernando. 16 p., 2ª ed. SP, Quinteto Editorial, 1986.

- "O Meu Amigo Pintor", de Lygia Bojunga Nunes. 52 p., 2ª ed. J. Olympio, RJ, 1988.

- "O Processo", de Franz Kafka. Trad. Modesto Carone. 254 p., 5ª ed. Editora Globo, SP, 2003.

- "O Sofá Estampado", de Lygia Bojunga Nunes. Il. Regina Yolanda. 108 p., 8ª ed. José Olympio, RJ, 1988.

- "O Tesouro da Nau Catarineta" (teatro), de Antonieta Dias de Moraes. 72 p., 3ª ed. Ed. Letras e Letras, SP, 2005.

- "O Último Moicano", de James F. Cooper. Adap. Luiz Antonio Aguiar. Il. Eduardo C. Pereira. 48 p., 1ª ed. Cia. Melhoramentos, SP, 1997.

- "O vampiro que descobriu o Brasil", de Ivan Jaf. Il. Líbero. 96 p., 1ª ed. Ática, SP, 2003.

- "Poemas Rupestres", de Manoel de Barros. 75 p., 2ª ed. Record, SP, 2006.

- "Pontos de Interrogação", de TB. 24 p. Il. André Neves. Noovha América, SP, 2005.

- "Tajá e sua gente", de José J. Veiga. 58 p., 2ª ed. Il. Raul Fernandes. Ed. Bertrand Brasil, RJ, 2006.

- "Trem de Alagoas e outros Poemas", de Luís Lorenzo Rivera (org.). Il. Gilberto Miadaira. 65 p., 1ª ed. Martins Fontes, SP, 2003.

- "Um passarinho cantou" (poesias), de Maria Lúcia Godoy. Ilustrações de Eliardo França. 18 p. Ed. Rio Gráfica, RJ, 1985.

- "Uma idéia toda azul", de Marina Colasanti. Il. dela. 64p., 19ª ed. SP, Global Editora, 1998.

Total: 49 livros.

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(1) Comentários constantes do livro:
Há no poema o encontro de dois temas relevantes no Romantismo: a natureza e a saudade da pátria. Considerado o poeta da natureza, Gonçalves Dias canta o amor, as florestas, a luz do sol brasileiro. Ele mesmo denominou seus poemas sobre elementos naturais de "poesias americanas".
Notamos, ainda, que os espetáculos da natureza conduzem seu pensamento a Deus, como uma celebração panteísta. E que esses trabalhos se mesclam à "poesia saudosista".
A natureza, refúgio e jardim de confidências do poeta, acode-o nos momentos de saudade e desalento. Esse homem nostálgico que rememora a infância e os passados amores é um intelectual que, na Europa, sente-se exilado, só, macambúzio, transportando-se pela memória até sua terra natal: concebe então a "Canção do Exílio", obra-prima da literatura universal.
Há dezenas de outras canções do exílio, a maioria paródias satíricas, especialmente modernistas --- todas porém em um tom respeitoso, reverencial.
Eis seu poema, escrito em julho de 1843, em Coimbra, Portugal:

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas.
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
"Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá.
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Minha terra tem palmeiras,
Que tais não encontro eu cá:
Em cismar --- sozinho, à noite ---
Mais prazer encontro eu lá:

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá:

Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá:
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Perfil do Autor:
Antônio Gonçalves Dias (1823-1864) foi um poeta, teatrólogo e dicionarista brasileiro. Nascido no Maranhão, era filho de uma união não oficializada entre um comerciante português com uma mestiça cafuza brasileira. Orgulhava-se de ter o sangue das três raças formadoras do povo brasileiro: branca, indígena e negra.
Em 1840, ingressa na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, onde se bacharelou.
Ainda em Coimbra, participou dos grupos medievistas da Gazeta Literária e de O Trovador, compartilhando das idéias românticas de Almeida Garrett, Alexandre Herculano e Antonio Feliciano de Castilho.Retorna ao Brasil em 1845.

(2) Comentários constantes do livro:
Tom Sawyer é o protagonista dos livros infantis "As Aventuras de Tom Sawyer", "As Viagens de Tom Sawyer" e "Tom Sawyer Detetive", todos escritos por Mark Twain (1835-1910), considerado o pai da literatura americana moderna.
Tom mora com a tia Polly e o irmão Sidney numa pequena cidade às margens do rio Mississippi (EUA), no século XIX. Esperto, ele e seu amigo Huckleberry se metem nas mais mirabolantes peripécias, safando-se sempre com sucesso.

Perfil do Autor:
Samuel Langhorne Clemens (Mark Twain) nasceu na Flórida, Missouri, filho de John e Jane Clemens, e faleceu em Ohio. De família pobre, triunfou na vida com muita honestidade e labor.
Sua obra abrange mais de quarenta títulos.

(3) Pronúncia de "Finnegans Wake": 'fínegans uêiki'. A tradução brasileira (como proposta pelos irmãos Campos e referendada por Donaldo Schüler), optou por ‘Finnicius Revém’. (Trata essa tradução de um livro de 650 páginas, e não da versão infanto-juvenil acima, condensada, com 128 páginas).

(4) Comentários constantes do livro:
A Odisséia conta as aventuras de Ulisses, rei de Ítaca, a quem, em virtude de numerosos perigos que encontra na estrada, foram precisos dez anos após a Guerra de Tróia para voltar à sua terra.
O próprio herói conta todas as peripécias, os inumeráveis perigos enfrentados por ele e seus destemidos guerreiros, durante dez anos, até a chegada ao lar, aos braços de sua esposa Penélope e seu filho Telêmaco.
A "Odisséia" pode ser tomada como representação da vida doméstica, entremeada de narrações de viagens e de aventuras fabulosas, extraordinárias, maravilhosas, enquadrando-se assim no objetivo do estudo da Literatura Infanto-Juvenil.
Traduzindo-o para uma linguagem acessível à juventude, a adaptação ruthrochiana procura preservar todos os seus capítulos, mantendo a estrutura e o esqueleto do poema original, mostrando a cultura grega da época, com todos os seus fascinantes elementos.As ilustrações de Eduardo Rocha, bem adequadas, mostram a arte grega da época, com destaque para a cerâmica branca.

Perfil do Autor:
Homero, segundo a tradição, era cego e natural de Quios. A ele se atribuem os poemas épicos Ilíada e Odisséia, que o consagram como o príncipe dos aedos (cantores) e rapsodos, ou, no dizer de Platão, "o educador da Grécia".
Todavia, tanto a sua existência quanto a autoria das suas monumentais obras têm sido motivo de controvérsia, chegando a afirmações díspares, como: "Ele nunca existiu!" ou "Sete cidades disputam seu nascimento...".

domingo, 13 de julho de 2008

Termos que podem suscitar dúvidas

Cânone (sm) 1 – Regra; preceito; padrão. 2 - Conjunto de normas do direito eclesiástico (direito canônico). 3 – Conjunto de regras ou princípios fundamentais: os "cânones" da arquitetura. (Essa palavra é mais usada no plural: cânones.)

Canonical (adj) – Referente a cônego.

Canônico (adj) 1 – Conforme os cânones da Igreja Católica: "leis canônicas". 2 – Conforme os cânones; regular; ortodoxo.

Canonizar (vtd) 1 – Reconhecer como santo; beatificar; declarar santo: A Igreja finalmente canonizou frei Galvão! 2 – Enaltecer; exaltar; consagrar.

Clichê (sm) – Idéia, expressão muito repetida; lugar-comum; chavão; frase-feita.

Maniqueísmo (sm) 1 – Doutrina segundo a qual o mundo foi criado por dois princípios opostos, o bem e o mal, e é regido por eles. 2 – Forma de julgamento ou de avaliação que reduz uma questão a dois aspectos inteiramente opostos.

Maniqueísta (adj) – Diz-se da pessoa que vê as coisas dessa forma.

Pertinência (sf) 1 – Propriedade; adequação: Ela fez um discurso pertinente (adequado, condizente) àquela ocasião. 2 – Relevância; importância: Teve cuidados relevantes. 3 – Vinculação; relação: Não há pertinência entre as palavras e as ações desse patife!

Pertinente (adj) – Relecionado; vinculado; pertencente; apropriado; adequado; conveniente.

Viés (sm) 1 – prisma, meio indireto: criticar pelo viés do humor. 2 – afastamento do padrão; desvio: evitar o viés antipedagógico. 3 – de viés; em sentido diagonal; obliquamente: olhar de viés. (Plural: vieses.)
Cf. enviesado: olhar enviesado (de lado), rua enviesada (oblíqua), saia enviesada.

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"Narrativas com formato canônico são as que configuram o romance, a novela e o conto, formas literárias já consagradas pelo seu amplo uso". (Luiz Henrique Costa, Professor de Teoria da Literatura)

Fontes de consulta:
Minidicionário Caldas Aulete, de Caldas Aulete. Apresentação de Evenildo
Bechara. 896 p., 2ª ed. Nova Fronteira, RJ, 2004.

Dicionário Escolar da Língua Portuguesa, de Domingos Paschoal Cegalla. 960 p., 3ª ed. Companhia Editora Nacional, SP, 2005.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Relação e situação de alguns livros da Pós-Graduação

"A Literatura no Brasil", de Afrânio Coutinho. 6 vols. 7ª ed. Global Editora, SP, 2004. Situação: Nem abri ainda.

"A Obra de Aquilino Ribeiro para Crianças", de Rui Marques Veloso. Porto Editora, Lisboa, 1990. Situação: Nem abri ainda.

"A Psicanálise dos Contos de Fadas", de Bruno Bettelheim. 440 p., 21ª edição, Paz e Terra, RJ, 2007.
Situação: Estou no meio.

"As raízes históricas do conto maravilhoso", de Vladimir Propp. Trad. Rosemary Costher Abílio. 471 p., 2ª ed. Martins Fontes, SP, 2002.
Situação: Nem abri ainda.

"Breve História da Literatura para Crianças em Portugal", de Natércia Rocha. 149 p., 1ª ed. Min. da Ed. de Portugal, Lisboa, 1984.
Situação: Nem abri ainda.

"Esta Força Estranha --- Trajetória de uma autora", de Ana Maria Machado. Coord. Vivina de Assis Viana. 74 p., 1ª ed. Saraiva, SP, 2006.

"Introdução à Literatura Fantástica", de Tzvetan Todorov. Trad. Maria Clara Castello. 185 p., 3ª ed. Perspectiva, SP, 2007.
Situação: Nem abri ainda.

"Literatura Infantil Brasileira", de Marisa Lajolo e Regina Zilberman. 190 p., 6ª edição, Ática, SP, 2006.
Situação: Estou relendo.

“Literatura Infantil --- gostosuras e bobices”, de Fanny Abramovich. Il. Mariângela Haddad. 176 p., 5ª ed. Scipione, SP, 2003.
Situação: Nem abri ainda.

"O Arco e a Lira", de Octavio Paz. Trad. Olga Savary. 368 p., 2ª ed. Nova Fronteira, RJ, 1982.
Situação: Nem abri ainda.

"O grande massacre dos gatos e outros episódios da história cultural francesa", de Robert Dartson. Trad. Sonia Coutinho. 363 p., 5ª ed. Editora Graal, RJ, 1986.
Situação: Lido.

"O que é Literatura Infantil", de Lígia Cadermatori. 90 p. 7ª edição, Brasiliense, SP, 2006.
Situação: Lido quatro vezes.

"Paisagens Imaginárias: Intelectuais, Arte e Meios de Comunicação", de Beatriz Sarlo. Trad. Rubia Prates e Sérgio Molina. 271 p., 2ª ed. Editora da USP, SP, 1997.
Situação: Nem abri ainda.

"Seis propostas para o novo Milênio", de Italo Calvino. Trad. Ivo Barroso. 141 p., 5ª ed. Companhia das Letras, RJ, 1990.
Situação: Lido.

"Teoria da Literatura: uma Introdução", de Terry Eagleton. 400 p., 6ª edição, Martins Fontes, SP, 2006.
Situação: Lido duas vezes.

"O Texto na Sala de Aula --- Leitura e Produção", de João W. Geraldi (org.). 4ª edição, 136 p., Ática, SP, 2006.
Situação: Lido duas vezes.


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O Curso se desenvolve em dez Módulos, num total de 141 livros, todos de teoria e doutrina.
A parte ficcional se acha em "Notícias de livros infantio-juvenis lidos em 2008".

terça-feira, 1 de julho de 2008

Apartai-vos, ombros amigos!

Vós, consoladores de plantão, solícitos louvadores, representais o desastre, a perdição da Literatura.

O escritor tem que sentir-se perdido, deslocado, banido, abandonado, desprezado, excluído do gênero humano. Então, prisioneiro da mais absoluta solidão, ele construirá amplas, luminosas e comoventes pontes de letras que o conectem aos demais mortais, rumo à Beleza.

Vede: Fiodor Dostoiévsky, Luís de Camões, Fernando Pessoa, William Shakespeare, Homero, Dante Alighieri e, menos, Miguel de Cervantes e Johann W. Goethe: quase todos "fora" do seu tempo, ou dele espantosamente expulsos pela intelectualidade.

Exorto-vos, pois, à transformação em lanças inimigas, em dardos dolorosos, que o empurrem impiedosamente para o Abismo --- “conditio sine qua non” (1) à perfeição estética, marca infalível da completa grandeza.

Porque deve o escritor dirigir seu discurso mágico, com a máxima humildade, não aos seus contemporâneos, mas às miríades de arcanjos do Futuro.

Deixai-o portanto, solidários amigos, cumprir em paz sua misteriosa missão!


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(1) Condição indispensável, necessária, essencial. Provém do Latim e significa "a condição sem a qual não se pode fazer algo".
Em Direito, trata-se de um recurso indispensável e fundamental, que condiciona o andamento da ação. Com o tempo, esta expressão migrou para outras ciências, como a Economia, a Filosofia e a Medicina.
Pronúncia: condício sine qua non.

Fontes: www.direitonet.com.br e
www.wikipedia.org.
Acess: 21/06/2008.

"A cor da ternura", de Geni Guimarães (memórias)

No Dicionário Aurélio Júnior, temos:
"Romance – Descrição longa das ações e sentimentos de personagens fictícios, numa transposição da vida para um plano artístico." (773)

"Novela – Narração, usualmente curta, ordenada e completa, de fatos humanos fictícios, mas, em regra, verossímeis." (618)

Observação nossa: o livro conta a vida da personagem, da infância à juventude – romance, portanto; todavia, fá-lo sem aprofundamentos psicológicos ou longas descrições – logo, novela.
Entendemo-lo como uma novela.
Por que?
Porque a autora sintetizou fatos e situações, expondo apenas a sua essência, destacando os pontos altos da narrativa. Chamamos a isso resumo, síntese, brevidade, sinopse, sumário, concisão (graças à precisão seletiva das palavras).
Toda abordagem crítica, da exegese solene à mais humilde resenha, parte de reflexões e, se boa tal abordagem, nelas se perde: é o seu melhor, mais legítimo e superior destino.
Narrado em primeira pessoa, em linguagem despretensiosa, focando cenas cotidianas de um ambiente rural, o livro encanta pelas passagens que conduzem uma criança negra da inocência infantil ao entendimento juvenil. Seu amadurecimento, experiência, surpresas, suas enfim conclusões sobre as pessoas e o mundo ocorrem de maneira delicada, porém constante e contundente. Expõem inequivocamente a discriminação explícita, o preconceito velado, as ilusões da menininha e os sonhos da mocinha. Sonhos simples e que, afinal, se realizam.
Destaque para a impressão de que estamos vivendo sua vida, e não apenas lendo sobre ela – tal a naturalidade do estilo e a construção pé-no-chão dos personagens.
A narrativa reflete uma ambiente religioso, notadamente católico: "Foi por isso que me botaram uma correntinha com um crucifixo no pescoço, aconselhado pelo padre da igrejinha local." (35)
A linguagem, posto que comum, coloquial, possui requintes de poesia e sensibilidade artística óbvios, como à página 60, após o elogio da professora e do diretor à sua poesia: "Fui para casa feliz. Sabiás empoleirados na cabeça da alma."
Ou à página 67, após manifestação velada de preconceito coletivo, em sala de aula: "Que se enxugasse o fino rio a correr mansamente. Mas como estancá-lo lá dentro, onde a ferida aberta era um silêncio todo meu, dor sem parceria?'
Ou ainda, à página 69, evocando a mãe: "Eu ouvia sua voz distante, bravadoce. Bálsamo."
...Achamo-nos então na cândida encruzilhada "Macados me mordam!" e "Raios me partam!", ao concluirmos a leitura. O veículo: espanto. O livro é a história de todas as infâncias.
Impressionam a comunicação tão fácil, a singeleza de uma criança se narrando ao narrar fatos de sua modesta, rica, humilde, esplendorosa (porque ímpar) vida.
Impressionam ainda a excelência de seus dez capítulos, a leveza de veludo do estilo e o efeito catalisador do conjunto.
Novela ou poema em prosa? --- Ambos. Por que não?
Com competência e sensibilidade, a narradora-protagonista nos conduz a recantos secretos e repletos de emoções, através de reflexões líricas e delicadas evocações.

Expressando-nos mais objetivamente, verificamos que o enredo se passa num ambiente rural, de plantações e lavouras, onde vivem a jovem e seus familiares. Seu pai e irmãos trabalham na roça, sem muita clareza se são colonos ou proprietários. A pacatez da trama, sem grandes complicações ou maior complexidade, demonstra tratar-se de uma história destinada ao público infanto-juvenil. O que não significa ausência de densidade dramática.

Poderíamos aqui reproduzir "verdades vazias e perfeitas" (verso pessoano), como:
"um permanente nó na garganta"
"história levíssima"
"flores de perpétua emoção"
"reminiscencias inolvidáveis"
"vales floridos da adolescência"

e outras tolices, mas humildemente ficamos com João Ribeiro e Rainer Maria Rilke; do primeiro, indicamos um artigo das "Páginas de Estética"(2): 'Acerca da difícil simplicidade' e, do segundo, rememoramos versos das "Elegias de Duíno"(3), que falam em sentimentos de "uma ternura imensa" diante das coisas "para sempre felizes" --- como livros bem escritos, primaveras, estrelas, anjos e Deus.
Impressão gráfica nítida e letras grandes.
Horrível a capa, ou melhor, o rosto da menina. Negro é lindo, e não esse esboço disforme. Choca. Só o rosto, porém.

Pareceram-nos as gravuras bem abaixo da qualidade do texto, com exceção de uma por capítulo, se tanto. Aconselhamos portanto à novelista que convide outro ilustrador, ou exija o melhor da atual --- tal como ela mesma se exige.



Notas:
(1) GUIMARÃES, Geni. A cor da ternura. 96 pp. 12ª edição. Editora FTD, São Paulo, 1998.

(2) RIBEIRO, João. Páginas d'Estética. J.O. Editora, RJ, 1967.

(3) RILKE, Rainer Maria. Elegias do Duíno. Trad. Dora Ferreira da Silva. Ed. Martins Fontes, SP, 2000.


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Perfil:
Geni nasceu em 1947, numa fazenda, em São Manuel, interior paulista. Infante ainda, mudou-se para outra fazenda, em Barra Bonita, onde ainda mora e leciona.
Na adolescência, colaborou em jornais locais, publicando poesias, crônicas e contos.
Obras:
"Terceiro filho" (poemas) - 1979
"Da flor o afeto" (poemas) - 1981
"Leite do peito" (contos)
"A cor da ternura" (novela) - 1998.

Já participou de várias antologias poéticas.
Recebeu o Prêmio Jabuti (Autor-revelação), em 1990, e uma Menção Especial da UBE/RJ, em 1991.

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Sobre a ilustradora Saritah Barboza, em suas próprias palavras: "Venho de uma familia de músicos, e meu pai é também artista plástico. Já participei de mais de dez exposições de arte. Acabei finalmente chegando até "A cor da ternura", que me traduz com a simplicidade e a negritude mais plenas."



Nota final:
Escrito em 18/12/2007.
Modificado 18 vezes.
Ocupei-me de sua obra por 41:50h, até 08/02/2010.

Nenhum milagre à vista

Há algo errado não com a Poesia, que cumpre suas metas, mas com os homens, que até se sensibilizam com ela mas continuam homens.

Humildemente repito o que alguém disse de Manuel Bandeira: "...e viveu em constante estado de poesia". Como Mário Quintana.

São tantas as bênçãos, não diárias, porém minutais, que deveríamos estar sempre orando --- não importa se ateus, agnósticos ou fiéis. A luz, o alimento, o calor, o agasalho, a convivência, as notícias, a nossa capacidade de entender as notícias, de fugir delas; as crianças, seus risos, os pequenos gestos de candura, os grandes livros e filmes, a Internet, a saudade...

Por que somos tão imutavelmente canalhas?

Os milhões de Fernandos Pessoas

Espero cheguem a ti, ligeiras, as aflições abaixo:
Dá graças à tua juventude, a partir da qual podes te corrigir ou errar menos (ou acertar mais!), conforme tua sabedoria, bom-senso e experiência.
Tua infelicidade atual é atual, e passará; tuas faltas, nem tão graves assim, como as expões, se comporão em acertos... Angustia-te menos.
Sofre mas convicto de que é devido a reveses da vida, e não só a erros teus que te castigam. Leiamos Camões:

Erros meus, má fortuna e amor ardente (1)
Em minha perdição se conjuraram...

Belíssimos versos, não? Só que inaplicáveis a ti, pois:
a) o gênio do Poeta elevou ao máximo a transfiguração lírica do real (vale dizer, dos seus sofrimentos, comuns a todos nós);
b) O "erros meus", admita-se, depõe contra ti --- num suposto tribunal do júri espiritual; mas e a "má fortuna" e o "amor ardente", que significam o destino e os sentimentos, sobre os quais não temos poder algum?! Em que artigos de lei esse severo fórum te enquadraria? Nenhum. Pois todos nos achamos sujeitos à "má fortuna" e ao "amor ardente"...
Minimiza pois teus sentimentos de culpa, teus remorsos, tua obrumbral noção de um "castigo justo e merecido". Não te submetas a julgamento algum! És livre para falhar e te emendares! Não crês em Deus? Ótimo! Ou crês Nele duma forma bem especial, só tua, que exclua Céu e Inferno? Sabe então que milhões de fernandos pessoas olhamos não para um Firmamento redentor, porém para a Natureza toda, panteisticamente. E a defendemos e protegemos e, com ela, quase dialogamos.
Mira por outro ângulo: católicos e evangélicos se crêem ungidos, salvos, e por isso nos intimidam com penas eternas, em Seu imurmurável nome.
...Mas se seu deus deles é misericordioso, por que puniria os humanos que furtassem, roubassem, estuprassem, matassem?! Esse "bom" deus, penso, não deixaria o homem pecar e se tornar indigno dos Céus e candidato favorito às Grandes Chamas, concordas?
Então aí já se nota, jovem, a falácia dos que se proclamam Seus profetas e pecam tanto ou mais que nós e nos ameaçam ainda, desde criancinhas, nas ruas, nos lares, à mesa, nas escolas, nas praças, nas igrejas, com as sentenças clássicas:
"Deus está vendo...", "Deus não gosta disso...", "Viu? Papai-do-Céu castigou...", "Bem que eu avisei..." etc. Que deus pérfido é esse deles, não?, que cria o Homem para a crueldade, as guerras, os assassinatos em massa --- e não só na "Alemanha de Hitler", como na "Roma dos Césares", no "Império Português", no "Vietname de Richard Nixon e Lyndon Johnson" (vê os filmes "Corações e Mentes" e "Platoon!"), no "Afeganistão e Iraque de George Bush"...
Fico aí com Omar Khayyám, poeta persa, que citarei em breve.
Fernando Pessoa desmascarou esse deus, de igual para igual, em vários poemas, ridicularizando-o até (que blasfêmia!). Mostra-o como um ente comum, mera invenção atemorizante.
Todavia se manteve ajoelhado, absorto poeticamente durante seus curtos 47 segundos, numa contrição e comunhão comoventes com o seu Deus.
Acalma-te portanto, sossega teu aflito interior riquíssimo.
Tens acaso culpa dos infortúnios do Mundo, da eterna partida de pessoas impartíveis e das ilusões de amor que deságuam na solidão, no silêncio, nos dramáticos braços do abandono? Das inimizades aparentes ou falsos apreços?
És nada mais que autor e réu, agressor e agredido, e muito mais inocente do que vislumbra teu inspirado espírito, já que, como pregou um pastor iguaçuano(2), "o homem só consegue influir (administrar, decidir) 10% do seu destino. Os restantes 90% pertencem ao Impossível, ao Imponderável".
Conduze teu destino sem imposições, sem onipresentes deuses ou manhosas sugestões alheias...

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Misteriosa, a alma. Ao fechar este grotesco esboço, envolveu-me um sentimento luminoso, de missão cumprida, de porcentagem bem administrada, seguido de tremores e discretas lágrimas. O idioma grego nos legou um termo clássico para tal ocorrência, tão imortal quanto a Grécia: "catarse". Porém eu, brasileiro, simplifico: "desabafo", "alma lavada".
Sim, porque não escrevi toda uma viagem (quase cinco horas) apenas para ti: escrevi de fato para mim, posto que iniciei a escritura para outrem.
Enfim confesso: errei, magoei, entristeci profundamente famílias inteiras devido a atitudes inconseqüentes e imaturas, oriundas de traumas e frustrações e complexos, na juventude(4). Aos 42 anos, casei-me. E eis o inesperado: mudei, amadureci, fiz concursos públicos, melhorei. Bom marido, bom pai, bom genro, bom vizinho...
Detalhe: não desposei a garota dos meus sonhos. Mas tenho esposa e filha felizes, realizando-se, progredindo, aproveitando a Cidade, seja nas caminhadas na orla, nas praias, nas reuniões, nos passeios, na contemplação do mar, dos monumentos, do multiverde e das delicadas florações. Há nisso tudo alguma lição para ti?

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Quanto às editoras, ignora-as: relembra Luís de Camões, Marcel Proust, James Joyce e tantos brasileiros recusados e hoje tão disputados...
Cuida mais (ou só) da tua Obra. Reescreve-a dez, vinte, cinqüenta vezes, sempre aprimorando teus conhecimentos técnicos e teóricos sobre a Literatura e os infinitos recursos da Língua Portuguesa. E: lê os outros, lê os outros, lê os outros. Grandes ou pequenos.
Falei do "teu aflito interior riquíssimo". Falaste-me dos poemas-espinhos, que tanto te ferem quanto te e nos cativam. Pois pelo pouco que te li, indago: onde a aflição, a alma, a riqueza?! As letras incandescentes, puro arame farpado cercando nossas almas-de-gado, a grama e a água corrente? A suprema angústia de Franz Kafka, Albert Camus e Fiódor Dostoiévski, o fervor trêmulo de Euclides da Cunha, a abissalidade de João da Cruz e Sousa? O gênio de Joaquim Machado de Assis? Enfim, onde as miríades de composições? Por que as tiraste do site?(3) Aparta-te dos bate-papos simples, supérfluos e vazios do Mural e do Fórum, onde se perde um tempo irretornável: polemiza menos, afasta-te das amenidades tão deliciosas quanto frívolas e fugazes... E inicia a solitária subida, que só tu podes, à poderosa, imensa, dolorosa, musical Montanha da dor original de que nos fala Rainer Maria Rilke nas Elegias de Duíno. Decide teu futuro: superficialmente polêmico ou admiravelmente poético?

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Pressinto a proximidade de um grande escritor. Depende de vários fatores, como:
1) a solução de tua vida sentimental: casas-te ou não com a srta. Y? (Se te casares, selarás o fim dos sofrimentos amorosos, da solidão, e, em conseqüência, da tua fonte atual de inspiração).
2) casas-te com outra moça e continuas te inspirando em Y; boa solução para a poesia, que ganhará em angústia e belos versos.
3) casas-te com Y e, acalmadas as paixões pela convivência diária, te dediques, com o mesmo fervor, a mesma reverência, à Arte --- a outros e igualmente belos assuntos.
Aonde quero chegar? --- À afirmação de que não existe poesia feliz e absoluta ao mesmo tempo. Uma Humanidade contente não faz versos: vive-os apenas.
Tem o artista de se tornar o refém voluntário da cruel Literatura e suas marcas de ferro e fogo (dramas, conflitos, delírios colossais), através de uma sempre maior dedicação ao fazer poético. Caso permaneças só, ou com outra te cases, Dante, Camões, Florbelinha, José Craveirinha, Cruz e Sousa e outros --- esses dulcíssimos parasitas da nossa alma tão lusa --- vão adorar:
"Oba, mais um a implorar à Poesia que eternize sua amada!"
E ei-lo perdendo razão e sonhos mas ganhando o direito de contemplar-se intimamente! Palmas e louros!

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(1) Erros meus, má fortuna, amor ardente
em minha perdição se conjuraram;
os erros e a fortuna sobejaram,
que para mim bastava o amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presente
a grande dor das cousas que passaram,
que as magoadas iras me ensinaram
a nao querer já nunca ser contente.

Errei todo o discurso de meus anos;
dei causa que a Fortuna castigasse
as minhas mal fundadas esperanças.

De amor não vi senão breves enganos.
Oh! quem tanto pudesse que fartasse
este meu duro génio de vinganças!

Fonte: www.bibvirt.futuro.usp.br
(Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro) - acessado em 01/09/2007.
(2) Pr. Laerte França, da Igreja Batista Memorial de Nova Iguaçu, tel. (021) 2660-3486 - ibmemorial@click21.com.br. Era onde eu levava minha filha, para futuro compromisso sério com Deus.
Hoje com dezoito anos, ela participa do Projeto Ide, aqui em Cabo Frio. Valeu portanto a convivência na Memorial!
(3) Em comunicado recente (agosto de 2007), o escritor participa que foi expulso do Recanto das Letras, tendo portanto todos os textos deletados.
(4) Inumeráveis foram e são meus pecados, erros imbecis, enganos inconsertáveis, topadas cavalares, homéricas jumentadas, falhas inomináveis, entulhos de egoísmos --- muito além do acima descrito.
Consolos:a) não tombei sozinho: arrastou-me a Humanidade.b) todos erraram, erram e errarão --- e só se darão conta dias, meses ou até anos após o erro.c) para reaver a humana dignidade, procuro fazer o bem, ser eqüânime, não prejudicar ninguém... E tento ser humilde --- dificílima missão!


Viagem Cabo Frio --- Nova Iguaçu, manhã de 11/01/2007.
Modificado 52 vezes até 26/01/2008.

Gestos Bonitos

No Haiti só há lixo, miséria, desemprego, famílias inteiras morrendo (fome e doenças), estradas de lama, rios de lama, favelas de lama e camelôs de lama que nada conseguem vender. Além da falta de luz, furacões e cadáveres insepultos.

Esbulhada durante séculos por potências estrangeiras (algumas com o aval da ONU), amordaçada e surrada por quem deveria defendê-la, essa ex-colônia francesa não tem como nem a quem apelar. "Pasto universal", acha-se "sem ar, sem luz, sem razão". (Antônio de Castro Alves)

Suspeita-se que o nosso país, destacado para protegê-lo, comandando uma força multinacional, incentiva e lidera violências, massacres e pilhagens contra a população indefesa.

Comenta-se que o Brasil apenas guarda (com mão e testa de ferro, obediente, servil) as riquezas naturais dele para usufruto das grandes economias (EUA, França, Inglaterra...).

E que a vida ali virou mera sobrevivência, desespero puro, depois que a ONU encheu o país de milícias truculentas e esvaziou sua soberania, seu patriotismo e sua autonomia política; agora, sem governo, sem cidadania e sem dignidade, simples fantoches, os haitianos não têm direito sequer a voz e voto. E pasme: Papai Noel lá é proibido por lei!

A mídia me passa a imagem de uma tropa brasileira idolatrada (e eu quase creio!). Todavia... então por que só circula armadíssima e blindada? Brincando de casinha? De sacanagem? Enfim eu creio sim:
1 - Nos "loucos", que mudam o Mundo (jamais os acomodados, os poderosos).
2 – Na Rede Globo, que me tornou mais percuciente e humano, com suas reportagens sobre garis, nordestinos, gestos bonitos, dramas pessoais humildes, histórias comoventes, flagelos da Natureza; com suas campanhas antifome e pró-brinquedos, suas denúncias, sua ética... Ela mostra fatos inaceitáveis, levando-me a pensar e agir.

Quão nobre é interpretar o alheio sofrimento, exigindo liberdade para os oprimidos... E não perder nunca, nunca a capacidade de indignação: jamais se calar diante das injustiças! Queria contar com você, escritor, intelectual, idealista, messeneiro dos bons: doe alimentos e roupas. Enquanto há vivos lá. Faça contatos. Existem ONGs sérias trabalhando. Ajude! Seus sonhos agradecem.

A República do Haiti também pertence à Humanidade...Outros dados sobre o Haiti:Quatro dos oito milhões são analfabetos.Quatro dos oito milhões, aidéticos.Desemprego: 70%.Abaixo da pobreza: 80%República desde 1804.Só pretos.Ampla violação de direitos humanos.

Este texto é:
- Para o jornalista Arnaldo Jabor;
- Para a irmã Anette Auguste, presa lá (incomunicável) desde 2000.

A uma princesa da Internet

Velejei de um poema a outro e outro. Partiu o detrator, aproximou-se o curioso. O iconoclasta, o leitor impassível cedeu lugar ao leitor só leitor.

A poetisa que li não só lava as palavras: estende-as em nossos varais, branquinhas branquinhas. Boas de vestir e exibir: vejam, acabei de ler trabalhos desta escritora!

Continue assim: seca, sintética e inspirada. Nada de versos ensopados de tolices românticas, de imagens ridículas e pensamentos previsíveis e banais.

Poema longos, mas breves: depende da nossa alma. Densos, porque pequenos. Tensos pelo conflito, pelo desabafo. Beleza e originalidade os possuem. Para que mais?

Ouvindo melhor sua voz, não há sussurros, mas vozes altíssimas, aleluiantes, louvando a Vida. Isto porque você evoluiu, amadureceu, se desviou mais do dia-a-dia e, isolada, sonhou. E transformou seus sonhos em versos melhores.

Que delicadeza feminina, maioral, suntuosa, solene, e ao mesmo tempo terna e humilde, dos que choram escondidos sob as asas do abandono! E quanto abandono e solidão entremostrados, quanto! Beijos...

Jovem: a afirmativa se pereniza pela repetição: o sofrimento sempre produz grandes versos, maiores até que o êxtase. Como da terra vêm as plantas e as flores e as frutas, da dor emerge a dádiva. A sua dádiva,moça,que agora compartilhamos. Mais versos, princesinha!

Textos não têm honra

Abro este artigo com uma citação de Fernanda Mussalim(1):"O objetivo do leitor crítico: explorar aligação entre as significações produzidas eas formas lingüísticas mobilizadas." (p. 15) O contexto do poeta: sua Escrivaninha. No caso do Recanto das Letras, procuro ler, além do texto focado, o perfil do autor, a sua produção completa ali exposta e todos os comentários afins. Não dispenso nem mesmo comentários deste escritor a outros, em suas escrivaninhas. Nem sempre, porém, consigo fazê-lo.

Inicia-se então o fascínio da coisa. Porque, uma vez produzido e publicado, o texto parece ao seu autor acabado e (quantas vezes!) perfeito.

E não: aí começam suas trajetórias pelo domínio social --- a comunidade de interlocutores, que, de novo e individualmente, o refletirá e emitirá (ainda que para si) juízos de valor:
--- " Eu? Comentar isto?! Fala sério..." ou
--- " Puxa, que lindo!"

Logo os textos se apresentam, na expressão de Fernanda Mussalim, como "produtos coletivos em constante processo de re-elaboração" (p. 23)

Desfilam eles, assim, ao nosso sabor de traças, que os selecionamos, digerimos e nos manifestamos:
--- "Delicioso!" ou
--- "Arghh!..."
--- "Eu? Comentar isto?! Fala sério..." ou
--- "Puxa, que lindo!"

Aí reside o embate: quanto uma traça publica sua opinião-que-maravilha!, tudo bem:
--- "Não falei? Eis meu talento reconhecido!"
--- "Isto sim é leitor! Interpretou exatamente o que eu quis dizer!"

Quando porém externa uma opinião-que-horror!, nada bem:
--- "A minha honra!..."
--- "Minha obra-prima, que escrevi de um jato!..."
--- "Mas com tantas opiniões favoráveis!..."
--- "Quase 50 mil leituras!..."
--- "O administrador do site não enxerga essas injustiças?!"
--- "Aí já é perseguição!"
--- "Vamos nos unir contra, gente!"

Quantos brios ofendidos! Quanto melodrama inglês-vendo! Quantos poemas vagabundos! Quanta diletância ilusória, exigindo reverências shakespearianas!

Fosse eu um texto, diria apenas: Escreva-me melhor, cavalheiro. Molda-me como um cântaro forte e trabalhado. Ou não chegarei inteiro ao imenso oásis da próxima geração...

Evite, substitua ou controle palavras como:
a) os adjetivos profundo, lindo, poético, bom, belo, excelente, maravilhoso;
b) os verbos ser, estar, ter e haver; e
c) os pronomes eu e você os advérbios bem, muito.

Senhores, textos não têm honra. Nem desonra.


___________
(1) "Linguagem --- Práticas de Leitura e Escrita" (vol. 1), de Fernanda Mussalim. Coleção Viver, Aprender. Global Editora Ltda., SP, 2004.


Obs.: Alertem-me por favor sobre qualquer tipo de erro. E obrigado por me lerem!

Sonhar e seus riscos

De certos textos nascem mãos que nos tocam de modo tão meigo, amigo, delicado... Ainda assim, há neles defeitos --- e muitos.

Um texto pouco trabalhado possui pistas demais e mistérios de menos. Texto raso, fácil entendimento, parca emoção.

Porque quanto mais elaborado, mais metafórico, metafísico e plurissignificativo ele fica. Compare-se a bula de um xarope aos versos de Vandalismo (1), de Augusto dos Anjos: qual nos faz explodir em sentimentos inexplicáveis embora compreensíveis? --- O poema, eu penso. Pois que a bula, pesada e medida, não contém contra-indicações, mostrando-se incapaz de nos le-var à construção de qualquer outro sentido fora do seu limite denotativo, meramente informador. Passiva, não nos faz sonhar.

Já Vandalismo, ao contrário, emerge desafiando a nossa inteligência e sensibilidade, com uma afirmação irreal:

Meu coração tem catedrais imensas.

Imediatamente comparamos nossos corações ao do vate, e constatamos: Sim, aqui cabem também tais catedrais. Ou: Não, ainda não cabem. Ou: cabe bem mais...

O que fizemos nós senão adaptar a onírica, irreal assertiva do verso ao nosso puro, racional, básico intelecto, ampliando seu sentido, multiplicando-o e unindo sua alogia à nossa inelutável lógica?

...Houve então um pequeno milagre: discernimos que bula é bula (sem riscos) e poema, poema (com infinitos riscos, vale dizer, com infinitas interpretações). Sonhamos.

Logo: a bula só nos informa; o poema, porém, nos deleita, nos infinita. Qual valerá mais?


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(1) Eis o soneto augustiano:

Meu coração tem catedrais imensas,
Templos de priscas e longínquas datas,
Onde um nume de amor, em serenatas,
Canta a aleluia virginal das crenças.

Na ogiva fúlgida e nas colunatas
Vertem lustrais irradiações intensas,
Cintilações de lâmpadas suspensas
E as ametistas e os florões e as pratas.

Como os velhos Templários medievais,
Entrei um dia nessas catedrais
E nesses templos claros e risonhos...

E erguendo os gládios e brandindo as hastas,
No desespero dos iconoclastas
Quebrei a imagem dos meus próprios sonhos!

Vozes Jovens

A leitura, o reconhecimento, o exame sério, pau-sado de trabalhos dos jovens, como os lírios, a barriga cheia, o amigo inseparável, levá-los-ão à autocrítica, crescendo literariamente.

Peço que enfim venham lê-los; que analisem com carinho as primeiras letras da meninada. E escrevam também: o Mundo precisa de mais água, mais verde, mais paz e mais luzes. Pertencem a todos, desde e para sempre, as ter-nas mensagens que, partindo das nossas meninas e meninos, buscam seus olhos, sua razão, sua emoção.

Segredem publicamente suas preferências líricas, interpretem a arte de Maria, o sofrimento de João...

Divulguem outros poetas. Plantem arvorezinhas alheias. Que a Poesia os ajardine...

Convido-os também a visitarem essas duas belezas trágicas da poesia brasileira: Vozes d'África e Navio Ne-greiro, de Antônio de Castro Alves. Façam suas almas investirem nesses nichos.


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Peço que me alertem sobre quaisquer erros aqui contidos. E obrigado por me lerem!

Juventude, Eterno Tesouro!

Perguntas levam a perguntas. Dúvidas, a dúvidas. Deus, a mais Deus. Boas, suas abordagens. Envolventes, suas angústias. Catárticos, esses seus textos.

Suas falhas: textos longos e mal escritos (em algumas partes); e, mesmo nas partes bem escritas, percebem-se óbvios espaços para melhorias. Idéias sérias e temas adequados vocês já têm. Vocês levam a Poesia a sério, realmente. Erros gramaticais, têm. Temas pouco e mal desenvolvidos, têm. Ingenuidades líricas, sim.Seus textos são ingênuos, simples, primaveris, contidos, mas não pueris. Que bom! Diferem de certos poemas, belos apenas para quem gosta de cantigas simples sobre simples amores.

Sou dos que preferem sons mais raros, melodias entornadas na alma. Por isso os releio sempre com especial carinho. Todavia sua inspiração existe de fato e nos atinge, nos toca como um carinho perdido. Parabéns!

Li, li seus lastimáveis versos. Alegrem-se! Camões, Cecília, Drummond também têm péssimos escritos, talvez de impossível conserto. Única diferença: a quantidade de versos excepcionais, muito superior à dos pobres.

Precisam vocês, deveras, revisar mais o que escrevem. Descobrir os lugares-comuns. Corrigir os solecismos. Deletar as palavras-espumas, que imenso é o seu Oceano de desnecessários cais. Tornem-se garis dos versos, que chegarão a ricos empresários das letras.

O sentimento: ternura. O gesto: aplauso. A atitude: respeito. A emoção: quase uma lágrima. A conclusão: singeleza.

Adolescentes: certas coisas perfeitas, encantadas, extre-mamente suaves ocorrem por acaso, sim; porém não com a fre-qüência sonhada. Permaneçam na Vida! "Carpe diem"!


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Nota:
O título deste artigo pertence a um filme do cineasta sueco Ingmar Bergman, autor de extensa filmografia, como:
Juventude, Eterno Tesouro (1950),
O Sétimo Selo (1957),
Morangos Silvestres (1958),
A Fonte da Donzela (1959),
Persona --- Quando Duas Mulheres Pecam (1966),
Gritos e Sussurros (1970),
Cenas de um Casamento (1973),
O Ovo da Serpente (1977) e
Fanny e Alexandre (1982).
IB faleceu em 30.07.2007, aos 89 anos. Comentando-o, o jornalista Rodrigo Fonseca escreveu:
"O Cineasta da Alma"
"Finitude, Deus, a agonia diante da existência, a solidão, a fragilidade das convenções sociais, a incomunicabilidade e as incongruências da vida a dois eram reflexões recorrentes nos mais de 50 filmes que Bergman assinou, para o cinema e para a televisão." (O Globo, 31/07/07)

Manifestou-se em semelhantes termos o jornalista cultural Arthur Dapieve, referindo-se também ao falecimento, no mesmo dia, de outro grande, Michelangelo Antonioni:
"Adeus ao Cinema"
"É uma injustiça poética, embora seja uma inevitabilidade biológica, e por isso acho que não devemos prantear vidas longas e produtivas como as deles, que partem quando mais precisamos de quem nos ensine a olhar. Porque estamos cegos no meio do matagal de imagens de TV aberta, TV por assinatura, DVD, vídeogame, celular, iPod, YouTube..." ( O Globo, 03/08/07)
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Alertem-me por favor sobre qualquer tipo de erro. E obrigado por me lerem!

Talvez se me ouvisses...

Tu criaste o "clima", o "contexto", o "ambiente". Faltou dar-lhe suporte técnico e estético. Explico-me: o teu estilo se acha mal elaborado, sem coesão, concisão, clareza e (talvez) correção: situações técnicas. E aos teus sentimentos de solidão, angústia e saudade faltou profundidade: situações estéticas.
Tuas tensões medianas, tua dramaticidade morna esbarrou em sensibilidade demais e no entanto pouco explorada literariamente.
Inseres muitas pequenas ações e observações desnecessárias, redundantes mesmo, nos teus textos. Muitas! Essa prolixidade empobrece a tua mensagem e nos cansa logo...
Vislumbrando o vate palavras fáceis, pantanosas, irresistíveis à primeira vista, cuidado! Essa arte, se comum, não arrebata. E ela fica comum se:
a) forem comuns as palavras;
b) forem triviais as idéias.

Teu texto resultou muito mais científico que literário. Ignora portanto os elogios anteriores e enfrenta a Poesia, que esperava um tributo e lhe empurraste um escrito supercósmico, mas pouco amplo, pouco envolvente, subtramado.
E, jovem, entende: tanto a Ciência quanto a Arte exigem submissão, exclusividade, vassalagem absolutas.
De qualquer modo, teu poema nos leva à meditação --- porque possui sim méritos artísticos.
Continua, por favor...

Deus, Dostoiévski e as Vocações Perdidas

Há no Recanto escritores com intenções literárias belíssimas, mas cuja vocação é o púlpito. Profetas e não poetas, procuram nos arrebanhar, nos convencer pela elocução religiosa, pela inspirada e espontânea mensagem bíblica.

Trata-se, no entanto, de uma sinceridade emprestada de infinitos outros escritos, parábolas e sermões, todos padronizados, uniformes, "rezando pela mesma cartilha" dos seus. Repetem eles, enfim, todos os discursos afins, que falam da grandeza de Deus, da necessária humildade, das glórias da conversão...

Impetuosos pregadores:
Conhecemos bem esse discurso universal --- e o amamos, acreditai. Respeitamo-lo sabiamente, crêde. Só que daí a reconhecer em vossos textos a mínima excelência literária (transfigurada em beleza de imagens, originalidade e algumas qualidades imprescindíveis ao estilo, como: correção, coerência, clareza, coesão, concisão e elegância), esse pecado crítico não vamos cometer mesmo, jovens profetas.

Tentais colocar a Literatura a serviço de Deus, o que não funciona literariamente...

Existindo no poema uma mensagem não-poética, ela não prejudica, mas valoriza o texto, desde que não contenha elementos panfletários, moralistas ou doutrinários que se sobreponham à sua finalidade literária.

Em Literatura, Deus às vezes atrapalha. Refiro-me aos escritores que, pelos séculos, produziram poemas-breviários ou prosa sacrossanta e nada mais, construindo barreiras morais à livre inspiração, às águas barrentas da cristalina poesia. E exalto os Castro Alves, os Bocages, os Khayyáns, pelos versos que, ainda que a Deus dirigidos, nos tocaram igualmente.

Vós sem dúvida habitareis o Azul; não assim vossa literatura: esta marcha inexoravelmente rumo ao Nada negro.
Direis porém: “Ô Jô, há grandes escritores cuja obra se acha imersa em Deus, tal a freqüência e profundidade Dele em seus livros. Basta abrir a “Divina Comédia”, o “Fausto”, o “Crime e Castigo”... E então?!"
Concordo, jovens.
Refletirei, se me permitis, sobre um sonho que tive, envolvendo Deus, Dostoiévski e os homens. Esta criatura, pegando um dia seu Criador pela mão, fê-Lo percorrer seus romances e, ao fim, Lhe disse:
--- Eis Tua Obra, Senhor! Comenta-a, peço-Te!

(Fiodor estava na verdade acertando as contas, dando o troco, devolvendo ao Altíssimo tanto sofrimento desnecessário e sem nexo, seu e da gente russa.) Constrangido e estupefato, o Senhor exclamou:
--- Mas estes seres independem de Mim para existirem! Que luz os ilumina? Que céu os acalenta? Que lógica os conduz?
Filho da Rússia: não concedi à Humanidade tanta alegria, arte, autonomia, beleza, bondade, ciência, consciência, delírio, humanidade, divindade, grandeza, ideologia, inocência, justiça, liberdade, paixão, paz, perdão, piedade, poder, poesia, prazer, razão, redenção, renúncia, saudade, sofrimento, solidão, sonho, ternura, transcendência, utopia --- tantos "deslimites" enfim!, pois assim os tornaria deuses!
E ainda: que feios defeitos Eu vejo, que não lhes coloquei?
--- Perdão, Senhor, há um equívoco.
--- Sim, Dost?
--- Esta não é a Humanidade, mas a minha projeção dela. Tais entes, que animei, saíram de Ti. Manipulei-os, simplesmente.
--- Mas Minha intenção era tão pura! Como a desvirtuaram tanto?
--- É que lhes deste também o livre-arbítrio. Descobriram que podiam agrupar-se em hordas de cossacos, de mujiques, deixar suas aldeias longínquas, atravessar as estepes do ressentimento, da ambição, da crueldade, do pecado, do orgulho, da perfídia, da vaidade, invadindo desordenadamente a metrópole das nossas almas...
--- Pois bem, ordeno-lhe que destrua a sua insuportável obra-de-luz!
--- Impossível, Senhor, porque ela está ou estará em todos os lares da Terra, até o Fim dos Tempos. Só o Senhor pode fazê-lo. E sei que não a destruirás, pois amas os justos e os sofredores. És, numa palavra, bom.
--- Bom... A propósito, Dost: as suas asas? A sua ausência do Paraíso?
--- Grande Sábio, claro que conheces as respostas, até das perguntas jamais formuladas...As asas emprestei-as ao povo russo, que entrou em mais um século de tribulações (dialogo contigo em julho de 2007).

Já a minha permanência aqui se dá para interceder de perto pela nossa gente pobre e os humilhados e ofendidos; para apagar da memória coletiva as recordações das casas dos mortos, para manter intactas as memórias do subsolo, dos homens subterrâneos que nos descobrimos; para exorcizar os involuntários demônios, para exigir exemplares castigos aos múltiplos crimes, para purificar e unir nossos grotescos irmãos...

Meu Deus: minha vida foi uma só oração! Deixa-me estar com meu povo. Errei? Sim, e muito. Porém todos --- vivos e mortos --- já me perdoaram. Como a todos perdoei.
--- Perdoou até aquele canalha do czar?!
--- Até o magnífico Nicolau I, agora pó e em breve nada. Aliás, tenho um pedido.
--- Diga, fiel servo meu.
--- Falaste acima em generosidade. Pois bem: suplico-Te o perdão universal.

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Voltando ao chão, apoiamo-nos em um comentário sobre Fiódor:
Achando-se portador de revelações sobrenaturais, ele tenta nos catequizar com profecias místicas sobre o pecado original, a idéia de que estamos sempre em dívida para com Deus, urgindo a expiação das culpas, visando à salvação... Seus romances são povoados de anti-heróis, párias, estudantes, burocratas, oficiais, nobres, corruptos, devassos, iluminados... --- todos repletos de desespero existencial e ausência de perspectivas, tropeçando em planos diabólicos e levantando-se em arrependimentos angelicais.

Sugerimos aos leitores a dignidade de abrir as Escrivaninhas desses honoráveis oradores e conferirem, checarem, pesarem os fatos, antes de se apartarem de nós.
Fechamos este artigo dirigindo-nos aos pregadores no início mencionados:

Vossos poemas, imperfeitos em conteúdo e forma, são no entanto hiper-sinceros, confessionais, triunfantes, sinfônicos.Tenho infelizmente plena consciência de que vossa literatura não prevalecerá perante os séculos. Vossa fé é meritória, louvável, sublime; vossos escritos, todavia, pecam por miríades de erros gramaticais e fatigantes repetições de conteúdos alheios --- conteúdos de domínio religioso já público há décadas, séculos talvez.


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Notas:
1 - Fiódor M. Dostoiévski (1821-1881) nasceu em Moscou. Começa a escrever bem jovem, freqüenta círculos literários. Envolve-se em conspirações, é preso, condenado à morte, perdoado, porém exilado na Sibéria.
Retorna dez anos depois a São Petersburgo, casa-se com Maria Dmitrievna, escreve e publica vários romances, todos fundamentais ao gênero humano. Morre Maria, e ele se casa de novo, em 1867, com Ana Sníktina, que administra carinhosa e firmemente suas finanças, seus compromissos editoriais e ainda acompanha seu trabalho literário. Anos depois, Fiódor morre, aos sessenta anos.

2 - Uma palavra sobre a coleção abaixo, composta de quatro números:
1 - "Panorama da Literatura Inglesa" - Cadernos Entrelivros nº 2, 100 págs., São Paulo, 2007.
2 - "Literatura Russa";
3 - "Literatura Americana"; e
4 - "Literatura Francesa".

Trata-se de uma publicação das mais sérias, envolvendo só profissionais competentíssimos, conhecedores completos, absolutos e apaixonados pelo assunto. Endereço para contatos, pedidos etc.: www.lojaduetto.com.br

3 - Algumas obras-primas dostoievskianas (traduções direto do idioma russo):
- Recordações da casa dos mortos (Nova Alexandria, 322 págs., trad. Klara Gourianova, R$ 49)
- Humilhados e ofendidos (Nova Alexandria, 322 págs., trad. Klara Gourianova, R$ 49)
- Memórias do subsolo (Editora 34, 148 págs., trad. Boris Schnaiderman, R$ 29)
- Os demônios (Ed. 34, 704 págs., trad. Paulo Bezerra, R$ 65)
- Crime e castigo (Ed. 34, 568 págs., trad. Paulo Bezerra, R$ 59)
- O idiota (Ed. 34, 672 págs., trad. Paulo Bezerra, R$ 65)

4 - Alguns testemunhos recentes sobre o Governo bolcheviche:
a) (...)“E uma quantidade de mortes de denunciantes russos --- mais recentemente a morte da jornalista Anna Politkovskaya em Moscou, bem como o envenenamento do ex-espião Alexander Litvinenko em Londres --- mostra que a história soviética passada não está totalmente enterrada.” (Resenha de Liesl Schiillinger)
Do livro Casa de Encontros, de Martin Amis, trad. Rubens Figueiredo. Companhia das Letras, 240, págs., R$ 39,50. O autor, ensaísta, contista e romancista, nasceu em 1949 em Oxford, Inglaterra.
Fonte: Revista Entrelivros nº 28, agosto de 2007, pág. 72.

b) Manchete d' O Globo: “Governo Putin interna opositora em hospício”
Larissa Arap, 48 anos, ativista russa da Frente Cívica Unida (FCU), foi obrigada pela polícia a entrar numa ambulância, dia 05 de julho, levando-a à força para um hospital psiquátrico, onde fi-cou internada sob escolta armada.
“Um ato de pura vingança”, denunciou ontem Yelena Vasiliyeva, chefe regional da FCU.
Seu crime: ter criticado, num artigo, práticas violentas no tratamento de doentes mentais, denunciando maus-tratos em clínicas psiquiátricas russas.
Os médicos responsáveis, usando um método de coerção típico da KGB soviética, injetaram drogas psicotrópicas em Larissa contra sua vontade. Em protesto, ela iniciou uma greve de fome que só interrompeu no último sábado, ao receber autorização para falar por telefone com sua filha.
A polícia não quis comentar a denúncia. A clínica negou tudo. O diretor do hospital-fantasma fugiu. Os telefones lá agora tocam para ninguém. ( Jornal brasileiro O Globo, 31.07.2007)

Apelo

Destruí-vos imediatamente, (des)humanos seres!
A Natureza --- águas, ar, plantas, pássaros, peixes, animais --- não precisa do Homem; este sim não sobrevive sem ela. Esta besta inteligente, que ultrapassou as estrelas e já se aproxima de Deus, não merece as bênçãos, as dádivas, os presentes diminutos, diários, essenciais da vida. ...E me dirão os puros de coração:
--- Até nós deveríamos...
--- Sim, até vós, nobres almas. Eliminai-vos também --- não sem antes exortar, convocar, induzir a raça humana à total extinção. Aliás, principalmente vós, cujo desprendido gesto conduzirá multidões ao sacrifício, imprescindível, sabemo-lo todos, à preservação das demais espécies.
Considerai, amados, o mudo reconhecimento das cobras, lagartos, escorpiões, hienas e baratas por tão corajoso passo! Os tubarões, as piranhas e arinhanhas se emocionarão sobremaneira... Matai-vos agora, estimados cidadãos! Cumpri logo esse luminoso destino!

Tão Simples!

Malfadados lugares-comuns! Ingênuo e inútil derramamento verbal! Que texto que não alça vôo! Que xaropada previsível!Precisa o escritor ousar mais, arriscar mais, elaborar melhor seus textos! A deusa Poesia espera --- bem longe! E ela não se aproxima nunca. Apenas aguarda... Até quando farás uma deusa esperar, seu mísero farsante?!

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Sugestão: enquanto há vida, há correções. E releituras, comparações com poemas alheios (deslumbrantes ou não), estudo de gramática e das figuras de linguagem. Melhorar deveras, só assim: aperfeiçoando-se fora do poema para depois voltar a ele empunhando as armas adequadas.
...Porém quem é o inimigo?!
Justa pergunta.

O inimigo é o Mundo, que --- tendo você algum valor literário --- sempre lhe exigirá perfeição, suavidade, emoção. Se não tiver tal valor, o Mundo nem o perceberá.

O amigo é também o Mundo, que lhe sorrirá submisso ante seu talento, fruto dos esforços artesanais.

Um poema com todas as palavras nos seus lugares, sem exageros sentimentais, comedido mas funcional, competente, emotivo --- eis só o que pede o Mundo.


Obs.: Alertem-me por favor sobre qualquer tipo de erro. E obrigado por me lerem!

Maviosas Ilusões

Em meus 61 anos, assimilei muitas coisas importantes. Aprendi que a vaidade humana, por exemplo, não possui fronteiras nem idade. E por inúmeros e excelentes sites de poesia transitam, lógico, nossas irrefutáveis excentricidades.

As pessoas jamais aceitam críticas humildemente. Já pensaram se tivéssemos aqui, neste espaço democrático, o poder de deletar não só os comentários desairosos, como também quem os fez?!Seria um poder perigoso, porque perderíamos a exata noção do nosso valor ou sequer chegaríamos a admitir nossas falhas literárias, visto que a priori usaríamos esse poder para vaderetrar o incômodo comentarista.

Os falsos elogios, que tanto nos enlevam e acomodam, impedem-nos de ver a perfeição, que só se mostra se ou quando usamos nossos mil olhos críticos, e não os dois olhos comuns, diários, ilusórios.Os escritores, em geral, ao pedirem que os comentem, visam na verdade a que os elogiem, e nunca que os critiquem.

*****
Tais observações apenas traduzem minha visão pessoal da Arte; nada mais. Sem maiores pretensões...Basta de grandiosas eloqüências.

Analiso os trabalhos como leitor comum, não como especialista; externo apenas impressões de leitura, jamais pareceres acadêmicos.Pobre é o crítico que afirma apenas: Gostei. Detestei. Logo sou pobre. No entanto sincero.

Após a leitura de vários autores, em diversos sites, vejo um saldo promissor: seu português já é impecável e eles continuam se aperfeiçoando na vida e na arte.

E: publiquem todos os poemas, exponham-nos ainda que com medo. Funciona!

Pois maior que o seu mundo é o Mundo. Mudem de assunto, ousem temas mil, ampliando-os, multiplicando-os e dando-lhes mais complexidade. Cresçam esteticamente!

Talvez porém seja a hora de pararem de escrever e começarem a reler, reescrever, rasgar, rasgar, rasgar...


Obs.: Alertem-me por favor sobre qualquer tipo de erro. E obrigado por me lerem!

Dóceis Gestos

Leio às vezes poemas ternos demais, puros demais, comuns demais, aos quais faltam dimensão artística, abissalidade, marcas de sofrimento, e onde predominam versos de uma frivolidade impressionante.

Uma avenida de tolices literárias, em alta velocidade, colidindo com o bom-gosto e a inteligência. Que mesmice! Que monotonia! Que "xerox" de outros milhares de versos semelhantes, puro lixo virtual! Poucos achados poéticos. E ainda assim, mal expressos.

Pobres de recursos estilísticos e tão desimaginados...

Meu poeta:
Sinta-se seus eventuais leitores: acha que ficarão leves, felizes, ao deparar com tamanhas pieguices? Você sem dúvida pensa que amou e acredita que sofre. Não, não: quem se imola de amor descobre-se imortal, revolvendo cada palavra cravada, arrancando-a e devolvendo-a em versos, que renascem sempre, ai ai.

Apenas seguem, esses mártires, a senda dos delírios; nada pedem, nem comentários. Ora, protestará você: "Não é justo! Eu só pedi uma opinião! Ele me arrasou!"

É justo sim. E pouco. Tem mais: dos muitos milhares de escritores da Rede, menos de mil pedem, por ano, um comentário dos mais de 100.000 poemas disponíveis na Internet. Covardia? Timidez? Narcisismo?

Aquele tapinha cúmplice nas costas ("Bom! Muito bom!"), que nada acresce à sua literatura nem à Literatura, outros que o dêem.Por que perderia eu a deliciosa chance de massacrá-lo, pisoteá-lo, empurrá-lo, enxotá-lo do excelso Olimpo?

Expulso-o deveras, para que sublime os maus-tratos e regresse em breve, triunfante e perene, por suas próprias pernas...

...Tenho no entanto uma outra proposta: que você, com suas agora esplêndidas asas verbais, não sobrepaire as escarpas, mas se mescle nelas, esses precipícios de criatividade. Tuas escarpas, nossa alegria...


Obs.: Alertem-me por favor sobre qualquer tipo de erro. E obrigado por me lerem!

Glória Sólida

Invisível, impalpável e inalcançável é a glória. O artista não a vê, pega ou alcança; essa alta missão cabe aos leitores, que não a podem sinalizar já, nem talvez este ano, nem daqui a quarenta, sessenta anos, com ele ainda em vida.

Seu talento não o vê o vate, apenas o pressente. Aos interessados em seus trabalhos compete essa 'glória': descobri-lo, convencer-se e convencê-lo do seu valor.

Sacrifiquem-se em poemas mais maduros, dolorosos, amargos, refletidos em vocês e espelhados no silêncio das sombras. Interiorizem-se mais! É sempe pouco, poetas!

Deixem o sofrimento, a angústia, a mais inconcebível solidão assentar no fundo de suas almas, e então sim escrevam.

Deixem os amores acontecerem e desacontecerem. Aceitem a brisa, sabendo-a futuro vento e enfim vendaval. Aí sim escrevam. E reescrevam, que as palavras são inúmeras e generosas. Elas mesmas lhes mostrarão o caminho da glória --- glória que só virá com as mais importantes distâncias, as mais cruzadas ausências.

Gostaria que estas palavras valessem para os melhores poemas de cada um, vez que não poderei lê-los por questão de tempo. Felicidades!


Obs.: Alertem-me por favor sobre qualquer tipo de erro. E obrigado por me lerem!

Literatura de Resultados

O sonho, as boas intenções, o ato de escrever são aplausíveis; o resultado, porém, mostra-se com freqüência lamentável como literatura, restando apenas muito sentimento derramado inutilmente.

Costumam meus comentários serem ásperos, cruéis, mordazes, ácidos, irônicos. Admito todavia que há textos bem construídos, bem estruturados, atraentes porque bem escritos (e reescritos)...

Como há textos rigorosamente indolentes, escritos sem a mínima aspiração a se elevarem à arte, com uma displicência de espantar; grandes desperdícios poéticos, pequenos festivais de banalidades, a léguas de uma estrutura formal tocante com conteúdo sensível.

Há mesmo inacreditáveis poemas, quase poemas, ex-poemas, além-poemas. Acúmulo verbal de nadas. Simples demais, quase infantis, aos quais faltam profundidade e estro. Piores ainda que os meus (que rasguei todos!) aos dezesseis anos. Poderíamos perfeitamente passar sem eles... Chega de desabafos mal-formulados em termos de poesia, não acham?

Como há os mais altaneiros, eloqüentes mas com algum conteúdo, fundados em justos desejos de felicidade. (Só que a Arte quer o dobro do dobro disso).

E por que mais altaneiros etc.? Porque mais meditados, mais sentidos, mais elaborados, e em conseqüência os prezamos mais. Dores transparentes.

E os poemas de fácil inspiração, feitos talvez entre a TV, a atenção às crianças e a verificação dos e-mails, tudo ao mesmo tempo? Não dizem, a rigor, nada. Tempo perdido. Atitude ideal: deletagem.


Obs.: Alertem-me por favor sobre qualquer tipo de erro. E obrigado por me lerem!

Condor? Andorinha?

O jovem poeta faz as coisas certas no tempo certo. Uma época sua, e só sua. Parabéns por vivê-la tão intensamente, flutuando nas esferas únicas da sua solidão e sua multidão.
Quando pede o poeta que lhe comentem os trabalhos, entendo que também aceite, além de aplausos, eventuais críticas.

Há poemas maduros, versáteis, profundos, como há aqueles a que faltou pensar muito e redigir mais: neles existe, às vezes, imensa profusão de banalidades, de sentimentos corriqueiros, de ingênuas declarações de amor, de penas de amor longamente enumeradas, que tumultuam a recepção do seu recado, a audição de seu sussurro.

(Isso se dá em todos os tempos, desde o início da Literatura. Daí a sabedoria da Natureza: já pensaram se todos os que escrevessem ficassem?)

Quando lemos tais trabalhos, tropeçamos amiúde em figuras e imagens que, de tão empregadas, não mais arrebatam. Míseros lugares-comuns. Nós leitores merecemos maior reverência: afinal selecionamos alguns escritos dentre milhares de outros para apreciar.

Por ser imaturo, em formação, às vezes faltam à poética do jovem desencanto, denúncia, amargura, revelação; vivência, amplidão, febre, obsessão; 'delirium tremens', contestação, temor cósmico, desequilíbrio, abismo, profundidade; desolação, passado, ancestralidade... (E faltam não por incompetência intelectual, mas porque ainda não é hora). Continue poeta.

Não se limite aos finitos "eus" e "tus" líricos: descubra o Infinito (com ou sem Deus), e exponha em versos o desespero da Vida, a emoção da Justiça, o enigma da Lei, a ânsia das fomes, a opressão sem fronteiras, o protesto soberano; o abandono calado, a epifania da ausência, a evocação mar aberto.

Aí sim você se revestirá das asas do condor e do vôo da andorinha. Que assim se completam. Além (embora próximos) de seus poemas plenos de delicadas meiguices, espera-o a Sociedade, o Tempo, a Realidade: párias famintos, analfabetos humildes, mártires convictos, democratas pacíficos, vencedores cruéis, vencidos idem, costumes inéditos, atos malditos, agressões imbecis, omissões dolorosas, 'meio' ambiente acuado... E então, criança escritora?


Obs.: Alertem-me por favor sobre qualquer tipo de erro. E obrigado por me lerem!

Ai de ti, Literatura!

A impressão é que todo poeta admira a lua, faz versos e produz o milagre de se expressar diferentemente sobre esse eterno satélite-tema. Na sua simplicidade, alguns poetas conseguem dar seqüência ao evento: escrevem de forma original, distinta, aterrissando lá com asas únicas, mostrando que poesia é arroubo, ousadia, sentimento desatado.

Abaixo a escritura mecânica, frívola, trivial, circunstancial...

Obs.: Alertem-me por favor sobre qualquer tipo de erro. E obrigado por me lerem!

"Decálogo do Crítico", por Michel Laub

Ler por obrigação, ganhar pouco, ser odiado por autores criticados ou ignorados por você. Ante tantos dissabores, saiba para que serve, afinal, fazer crítica literária.


I - Quase todos os outros profissionais da categoria, trabalhem eles com música, cinema, gastronomia, televisão ou concursos de beleza, estão bem mais próximos da figura descrita por George Orwell em Confissões de um resenhista: “Trinta e cinco anos, mas aparenta cinqüenta
(...) [trabalha num] conjugado frio, mas abafado (...). Dos milhares de livros que aparecem todo ano, é quase certo que existam 50 ou 100 sobre os quais teria prazer em escrever. Se for de primeira categoria na profissão, pode conseguir dez ou vinte. É mais provável que consiga dois ou três”.


III - Ou seja, prepare-se para uma atividade enfadonha e mal-remunerada. Você lerá só por obrigação. Nunca mais irá atrás de um livro indicado por um amigo. Nunca mais fechará um livro com a sensação de que, para o bem ou para o mal, não há nada a dizer sobre ele. Porque sempre haverá o que dizer. Se não houver, as contas não são pagas.


IV - Não se preocupe, porém. Há muitos truques para encher essas páginas em branco. Se você quer desancar um livro e não sabe como, recorra a alguns adjetivos algo abstratos em se tratando de literatura, mas ainda assim úteis numa resenha. A timidez, por exemplo. Argumente que o autor não explora suficientemente os conflitos de sua obra. Afinal, explorar conflitos é uma tarefa que não tem fim, e há um momento em que todo autor, por mais extrovertido que seja, precisa parar.
Outros chavões sempre à mão: excesso de objetividade,excesso de subjetivismo, excesso de frieza, excesso de dramaticidade. A categoria das “idéias fora de lugar”, deslocada de seu contexto original, também ajuda bastante. Um romance correto, instigante e envolvente pode ser atacado por reproduzir um modelo “burguês” de contar histórias, incompatível com o nosso tempo. Um romance sem essas características pode ser destruído, justamente, por ser mal-escrito e não envolver o leitor.


V - Para o caso contrário, isto é, se você quer elogiar um livro que acha ruim – o das linhas finais do item IV, por exemplo –, há dois recursos clássicos:

a) em relação à prosa desagradável, escatológica e/ou ilegível, diga que ela reproduz o incômodo e a irredutibilidade de sentidos do mundo contemporâneo;

b) em relação à trama caótica e fragmentária, quando não se entende o que é início, o que é fim e do que é mesmo que estamos falando, afirme que a maçaroca reproduz, como uma “metáfora estrutural”, o caos fragmentário da sociedade pós-industrial.


VI - Usando desses truques, você está pronto para fazer nome devido à afinação com o vocabulário crítico de sua época.
Mas se, por um desses acasos raros, você está decidido a realmente dizer o que pensa, há também dois caminhos a seguir.
O primeiro é confiar cegamente nos seus juízos pessoais, não temendo a exposição de seus preconceitos íntimos em público. Assim, você terá mais chances de ser considerado um sujeito ranheta, excêntrico e/ou pervertido.
O segundo caminho é considerar-se porta-voz de um “sistema”, para o qual são válidas mesmo obras que não são do seu agrado (por questões sociológicas, por exemplo).
Mesmo que os motivos sejam nobres – sua humildade para não se considerar o juiz definitivo sobre o que é ou não relevante em termos estéticos –, há boas probabilidades de você ser visto como um crítico sem alma, sem coragem, sem graça.


VII - Independentemente de sua escolha, é inevitável que você seja desprezado. Todos dirão que seu desejo secreto era ser ficcionista ou poeta, que você é leviano demais, complacente demais, que tem algum interesse obscuro – ascender na carreira, agradar aos pares da universidade, arrumar um(a) namorado(a) – ou está a soldo de alguma entidade obscura – grupos literários rivais, editores, maçons, seitas religiosas, partidos políticos de esquerda (se você escrever numa pequena publicação) ou de direita (se receber salário de alguma corporação de mídia).


VIII - Mais que isso: você será odiado. Pelos autores que você desanca. Pelos autores que você ignora. Pelos autores que você elogia (os motivos serão sempre os errados, na opinião deles). Pelos outros críticos. Por boa parte do público, mesmo por aquele que o lê com freqüência. IX - Mas se, apesar de tudo isso, você ainda insiste em abraçar a profissão, é bom se perguntar o motivo.
Quando criança, usando o olfato, Robert Parker era capaz de listar todos os ingredientes dos pratos que estavam sendo cozinhados na vizinhança, habilidade que o tornaria um campeão absoluto dos “testes cegos” de identificação de uvas e safras.
Isso se chama vocação. É o seu caso? Você se sente preparado para conjugar erudição e capacidade interpretativa em tamanha escala? Sendo a resposta afirmativa, trata-se de uma ótima notícia. Não só para você, que talvez tenha achado um modo honesto de ganhar a vida, mas para o próprio meio literário. Porque não há nada de que ele necessite mais, hoje ou em
qualquer tempo: alguém que o ajude a firmar tendências, corrigir rumos, separar o joio do trigo.

Diferentemente do que se diz, um crítico autêntico não é apenas o advogado do público. Ele é, em última instância, o maior defensor da própria Literatura.

Fonte: Revista "Entrelivros"

"Decalógo do Leitor", por Alberto Mussa

I - Nunca leia por hábito: um livro não é uma escova de dentes. Leia por vício, leia por dependência química. A literatura é a possibilidade de viver vidas múltiplas, em algumas horas. E tem até finalidades práticas: amplia a compreensão do mundo, permite a aquisição de conhecimentos objetivos, aprimora a capacidade de expressão, reduz os batimentos cardíacos, diminui a ansiedade, aumenta a libido. Mas é essencialmente lúdica, é essencialmente inútil, como devem ser as coisas que nos dão prazer.

II - Comece a ler desde cedo, se puder. Ou pelo menos comece. E pelos clássicos, pelos consensuais. Serão cinqüenta, serão cem. Não devem faltar 'As mil e uma noites', Dostoiévski, Thomas Mann, Honoré de Balzac, Adonias Filho, Joseph Conrad, Jorge de Lima, Edgar Allan Poe, Gabriel García Márquez, Miguel de Cervantes, José de Alencar, Luís de Camões, Alexandre Dumas, Dante Alighieri, William Shakespeare, Herman Melville, Gustave Flaubert, Graciliano Ramos, Jorge Luís Borges, Anton Tchekov, Sófocles, Joaquim Machado de Assis, Alejo Carpentier, Italo Calvino, João Guimarães Rosa, José Maria Eça de Queiroz, Gionvanni Boccaccio, Jorge Amado, Benedetti, Fernando Pessoa, Franz Kafka, Miguel Angel Asturias, Antônio Callado, Ruan Rulfo, Nelson Rodrigues, Federico García Lorca, Homero, Afonso Henriques de Lima Barreto, Júlio Cortázar, Johann W. von Goethe, Voltaire, Emily Brontë, Marquês de Sade, Érico Verissimo, William Faulkner, Guy de Maupassant, Leon Tolstói, Marcel Proust, Autran Dourado, Victor Hugo, Henry James, Antônio de Castro Alves...

III - Nunca leia sem dicionário. Se estiver lendo deitado, ou num ônibus, ou na praia, ou em qualquer outra situação imprópria, anote as palavras que você não conhece, para consultar depois. Elas jamais são escritas por acaso.

IV - Perca menos tempo diante do computador, da televisão, dos jornais e crie um sistema de leitura, estabeleça metas. Se puder ler um livro por mês, dos 16 aos 75 anos, terá lido 720 livros. Se, no mês das férias, em vez de um, puder ler quatro, chegará aos 900. Com dois por mês, serão 1.440. À razão de um por semana, alcançará 3.120. Com a média ideal de três por semana, serão 9.360. Serão apenas 9.360. Escolha bem o que você vai ler.

V - Faça do livro um objeto pessoal, um objeto íntimo. Escreva nele; assinale as frases marcantes, as passagens que o emocionam. Também é importante criticar o autor, apontar falhas e inverossimilhanças. Anote telefones e endereços de pessoas proibidas, faça cálculos nas inúteis páginas finais. O livro é o mais interativo dos objetos. Você pode avançar e recuar, folheando, com mais comodidade e rapidez que mexendo em teclados ou cursores de tela. O livro vai com você ao banheiro e à cama. Vai com você de metrô, de ônibus e de táxi. Vai com você para outros países. Há apenas duas regras básicas: use lápis; e não empreste.

VI - Não se deixe dominar pelo complexo de vira-lata. Leia muito, leia sempre a literatura brasileira. Ela está entre as grandes. Temos o maior escritor do século XIX, que foi Machado de Assis; e um dos três maiores do século XX, que foram Jorge Luís Borges, Franz Kafka e Guimarães Rosa. Temos um dos quatro maiores épicos ocidentais, que foram Homero, Dante, Camões e Jorge de Lima. E temos um dos três maiores dramaturgos de todos os tempos, que foram Sófocles, Shakespeare e Nelson Rodrigues.

VII - Na natureza, são as espécies muito adaptadas ao próprio 'habitat' que tendem mais rapidamente à extinção. Prefira a literatura brasileira, mas faça viagens regulares. Das letras européias e da América do Norte vêm a maioria dos nossos grandes mestres. A literatura hispano-americana é simplesmente indispensável. Particularmente os argentinos. Mas busque também o diferente: há grandezas literárias na África e na Ásia. Impossível desconhecer Angola, Moçambique e Cabo Verde. Volte também ao passado: à Idade Média, ao mundo árabe, aos clássicos gregos e latinos. E não esqueça o Oriente; não esqueça que literatura nenhuma se compara às da Índia e da China. E chegue, finalmente, às mitologias dos povos ágrafos, mergulhe na poesia selvagem. São eles que estão na origem disso tudo; é por causa deles que estamos aqui.

VIII - Tente evitar a repetição dos mesmos gêneros, dos mesmos temas, dos mesmos estilos, dos mesmos autores. A grande literatura está espalhada por romances, contos, crônicas, poemas e peças de teatro. Nenhum gênero é, em tese, superior a outro. Não se preocupe, aliás, com o conceito de gênero: história, filosofia, etnologia, memórias, viagens, reportagem, divulgação científica, auto-ajuda – tudo isso pode ser literatura. Um bom livro tem de ser inteligente, bem escrito e capaz de provocar alguma espécie de emoção.

IX - A vida tem outras coisas muito boas. Por isso, não tenha pena de abandonar pelo meio os livros desinteressantes. O leitor experiente desenvolve a capacidade de perceber logo, em no máximo 30 páginas, se um livro será bom ou mau. Só não diga que um livro é ruim antes de ler pelo menos algumas linhas: nada pode ser tão estúpido quanto o preconceito.

X - Forme seu próprio cânone. Se não gostar de um clássico, não se sinta menos inteligente. Não se intimide quando um especialista diz que determinado autor é um gênio, e que o livro do gênio é historicamente fundamental. O fato de uma obra ser ou não importante é problema que tange a críticos; talvez a escritores. Não leve nenhum deles a sério; não leve a literatura a sério; não leve a vida a sério. E faça o seu próprio decálogo: neste momento, você será um leitor.

Fonte: Revista "Entrelivros"
E-mail do autor: albertomussa@gmail

"Decálogo do Autor", por Miguel Sanches Neto

Depois de leitor, você pode se tornar, então, escritor – embora, pasme, muitos hoje pulem a leitura, por julgá-la dispensável, e já desejem publicar.

I - Não fique mandando seus originais para todo mundo. Acontece que você escreve para ser lido extramuros, e deseja testar sua obra num terreno mais neutro. E não quer ficar a vida inteira escrevendo apenas para uma pessoa. O que fazer então para não virar um chato? No passado, eu aconselharia mandar os textos para jornais e revistas literárias, foi o que eu fiz quando era um iniciante bem iniciante. Mas os jovens agora têm uma arma mais democrática: Publicar na Internet. Há muitos espaços coletivos, uma liberdade de inclusão de textos novos e você ainda pode criar seu próprio site ou 'blog', mas cuidado para não incomodar as pessoas, enviando mensagens e avisos para que leiam você.

II - Publique seus textos em 'sites' e 'blogs' e deixe que sigam o rumo deles. Depois de um tempo publicando eletronicamente, você vai encontrar alguns leitores. Terá de ler os textos deles, e dar opiniões e fazer sugestões, mas também receberá muitas dicas.

III - Leia os contemporâneos, até para saber onde é o seu lugar. Existe um batalhão de internautas ávidos por leitura e em alguns casos você atingirá o alvo e terá acontecido a magia de um texto encontrar a pessoa que o justifica.
Mas todo texto escrito na internet sonha um dia virar livro. 'Sites' e 'blogs' são etapas, exercícios de aquecimento. Só o livro impresso dá 'status' autoral. O que fazer quando eu tiver mais de dois gigas de textos literários? Está na hora de publicar um livro maior do que 'Em Busca do Tempo Perdido'?
Bem, é nesse momento que você pode continuar sendo um escritor iniciante comum ou subir à categoria de iniciante com experiência. Você terá que reduzir essas centenas e centenas de páginas a um formato razoável, que não tome muito tempo de leitura de quem, eventualmente, se interessar por um livro de estréia. Para isso, você terá de ser impiedoso, esquecer os elogios da mulher e dos amigos e selecionar seu produto, trabalhando duro para que fique sempre melhor.

IV - Considere apenas uma pequenina parte de toda a sua produção inicial, e invista na revisão dela, sabendo que revisar é cortar. O livro está pronto. Não tem mais do que 200 páginas, você dedicou anos a ele e ainda continua um iniciante. Mas um iniciante responsável, pois não mandou logo imprimir suas obras completas com não sei quantos tomos, logo você que talvez nem tenha completado 30 anos.
Mas você quer fazer circular a sua literatura de maneira mais formal. Quer o livro impresso. E isso é hoje muito fácil. Você conhece um amigo que conhece uma gráfica digital que faz pequenas tiragens e parcela em tantas vezes. O livro está pronto. E anda sobrando um dinheirinho, é só economizar na cerveja.

V - Gaste todo seu dinheiro extra em cerveja, viagens, restaurantes e não pague a publicação do próprio livro. Se você fizer isso, ficará novamente ansioso para mandar a todo mundo o volume, esperando opiniões que vão comparar o seu trabalho ao dos mestres.
O livro impresso, mesmo quando auto-impresso, dá esta sensação de poder. Somos enfim Autores. E podemos montar frases assim: Borges e eu valorizamos o universal. Do ponto de vista técnico, Borges e eu estamos no mesmo nível: produzimos obras impressas; mas a comparação não vai adiante.
Então como publicar o primeiro livro se não conhecemos ninguém nas editoras? E aí começa um outro problema: procurar pessoas bem postas em editoras e solicitar apresentações. Na maioria das vezes isso não funciona. E, mesmo quando o livro é publicado, ele não acontece, pois foi um movimento artificial.

VI - Nunca peça a ninguém para indicar o seu livro a uma editora. Se por acaso um amigo conhece e gosta de seu trabalho, ele vai fazer isso naturalmente, com alguma chance de sucesso. Tente fazer tudo sozinho, como se não tivesse ninguém mais para ajudar você do que o seu próprio livro. Sim, este livro em que você colocou todas as suas fichas. E como você só pode contar com ele...

VII - Mande seu livro a todos os concursos possíveis e a editoras bem escolhidas, pois cada uma tem seu perfil editorial. É melhor gastar seu dinheiro com selos e fotocópias do que com a impressão de uma obra que não será distribuída e que terá de ser enviada a quem não a solicitou.
Enquanto isso, dedique-se a atividades afins para controlar a ansiedade, porque essas coisas de literatura demoram, demoram muito mesmo. Você pode traduzir textos literários para consumo próprio ou para jornais e revistas, pode fazer resenhas de obras marcantes, ler os clássicos ou simplesmente manter um diário íntimo. O importante é se ocupar.
Com sorte e tendo o livro alguma qualidade além de ter custado tanto esforço, ele acaba publicado. Até o meu terminou publicado, e foi quando me tornei um iniciante adulto. Tinha um livro de ficção no catálogo de uma grande editora. E aí tive de aprender outras coisas.
Há centenas de livros de iniciantes chegando aos jornais e revistas para resenhas e uma quantidade muito maior de títulos consagrados. E a maioria vai ficar sem espaço nos jornais. E é natural que os exemplares distribuídos para a imprensa acabem nos sebos, pois não há resenhistas para tantas obras.

VIII - Não force os amigos e conhecidos a escrever sobre seu livro. Não quer dizer que eles não possam escrever, podem sim, mas mande o livro e, se eles não acusarem recebimento ou não comentarem mais o assunto, esqueça e não lhes queira mal, eles são nossos amigos mesmo não gostando do que escrevemos.
Se um ou outro amigo escrever sobre o livro, festeje mesmo se ele não entender nada ou valorizar coisas que não julgamos relevantes em nosso trabalho. E mande umas palavras de agradecimento, pois você teve enfim uma apreciação.
E se um amigo escrever mal de nosso livro, justamente dessa obra que nos custou tanto? Se for um desconhecido, ainda vá lá, mas um amigo, aquele amigo para quem você fez isso e aquilo.

IX - Nunca passe recibo às críticas negativas. Ao publicar você se torna uma pessoa pública. E deve absorver todas as opiniões, inclusive os elogios equivocados. Deixe que as opiniões se formem em torno de seu trabalho, e talvez a verdade suplante os equívocos, principalmente se a verdade for que nosso trabalho não é lá essas coisas.
O livro está publicado, você já pensa no próximo, saíram algumas resenhas, umas superficiais, outras negativas, uma muito correta. Você é então um iniciante com um currículo mínimo. Daí você recebe a prestação de contas da editora, dizendo que, no primeiro trimestre, as devoluções foram maiores do que as vendas. Como isso é possível? Vejam quantos livros a editora mandou de cortesia. Eu não posso ter vendido apenas 238 exemplares se, só no lançamento, vendi 100, o gerente da livraria até elogiou – enfim uma vantagem de ter família grande.

X - Evite reclamar de sua editora. Uma editora não existe para reverenciar nosso talento a toda hora. É uma empresa que busca o lucro, que tem dezenas de autores iguais a nós e que quer ter lucro com nosso livro, sendo a primeira prejudicada quando ele não vende.
Não precisamos dizer que é a melhor editora do mundo só porque nos editou, mas é bom pensar que ocorreu uma aposta conjunta e que não se alcançou o resultado esperado. Mas que há oportunidades para outras apostas e, um dia, quem sabe...
Foi tentando seguir estas regras que consegui ser o autor iniciante que hoje eu sou.

Fonte: Revista "Entrelivros"