terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

"Homenagem a Ingedore Villaça Koch" (Leonor Werneck dos Santos)

Esta homenagem a Ingedore Koch, do Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos, com a "Medalha Isidoro de Sevilha de Destaque em Linguística e Filologia em 2007", é mais que merecida.

Este momento, partilhado com profissionais da ordem de Luiz Antonio Marcuschi e Maria Helena Moura Neves, coloca em destaque uma tríade de pesquisadores que definiram novos rumos da Lingüística no Brasil, nos últimos anos. Participar desta tripla homenagem é uma felicidade. E representar Ingedore, uma honra.

Apresentar nossa querida Inge é tarefa fácil e, ao mesmo tempo, difícil. Como apresentar uma das precursoras da Lingüística Textual no Brasil, junto com nosso querido e também homenageado Luiz Antonio Marcuschi? Como falar da pessoa amiga que tem sempre um abraço caloroso à nossa disposição? Como resumir a produção acadêmica de alguém que, com aparência tão frágil, surpreende pelo vigor com que continua a orientar, publicar, apresentar trabalhos em congressos?

Começo pela produção acadêmica: mais de 20 livros, dezenas de orientações e co-orientações de Mestrado e Doutorado, uma centena de capítulos de livros e artigos publicados, cerca de 200 participações em congressos nacionais e internacionais, mais de 200 participações em Bancas de Dissertações e Teses. Se os números impressionam pela quantidade de pesquisas e orientações, mais importante é destacar a qualidade do trabalho de quem, ao longo de décadas de magistério, sempre primou pela ética, seriedade, dedicação e – característica às vezes difícil de encontrar – humildade.

Peço licença, aqui, para relatar meus primeiros contatos com Ingedore. Em 1997, quando ainda iniciava meu Doutorado pela UFRJ e contava apenas dois anos de magistério nessa Universidade, participei do Congresso da ABRALIN, em Maceió.

Na ocasião, durante duas semanas, pude fazer um curso com alguém que só conhecia dos livros, e, em todas as aulas, o que se via era uma senhora delicada, atenta a cada pergunta que fazíamos, divertida nos comentários, séria nas citações, determinada a fazer-nos acompanhar as mais recentes pesquisas de Linguística Textual. A paixão foi imediata!

Meses depois, ao definir minha linha de pesquisa, conversando com minha orientadora, a Profª. Dra. Maria Eugenia Lamoglia Duarte, logo surgiu a ideia de chamarmos Ingedore Koch para coorientar minha Tese. Fui a Campinas, após uma breve conversa por telefone, envergonhada de incomodar alguém tão ocupada com minhas dúvidas e sem saber como fazer-lhe o convite para a coorientação.

Ao chegar ao seu gabinete de trabalho na UNICAMP, Ingedore me recebeu com o caloroso abraço de sempre, o sorriso que não deixava dúvidas da alegria em me rever... e uma pilha de textos que havia separado para me ajudar na pesquisa, sem que eu sequer houvesse pedido qualquer ajuda. Emocionada, pedi-lhe que me coorientasse e ouvi em resposta: "Fico feliz de você ter me convidado! É claro que aceito!"

A disposição em dividir seu conhecimento, o olhar atento para novas descobertas, a alegria em participar de conquistas, tudo isso marca o contato de todos que podem partilhar alguns momentos com Inge.

Se descrevi sua produção acadêmica e algumas características pessoais, falta, então, concluir, destacando a importância de Ingedore Koch para os estudos linguísticos. Pioneira na Linguística Textual no Brasil, já no início da década de 80, ela desenvolvia projetos de pesquisa voltados para uma área que, na época, era vista com desconfiança.

Segundo Marcuschi, em emocionante texto também em homenagem a Ingedore, aquele trabalho naquele contexto não foi fácil, pois ali estava um momento particularmente difícil para esse tipo de investigação. O gerativismo andava na crista da onda e as linhas de trabalho ditas "discursivas" não eram bem-vistas. Foi a qualidade do trabalho aliada à intensidade das investigações relacionadas ao ensino de língua que resultou uma perspectiva teórica hoje madura e influente na renovação dos critérios, categorias e propostas de pesquisa e ensino da língua.

O papel de incentivadora que Ingedore Koch teve e ainda tem nesse complexo processo de reordenamento teórico em âmbito nacional é não apenas indiscutível, mas visível na sua presença como mentora e teórica de primeira água. Com ela, passamos a entender a trajetória e os grandes temas da Linguística Textual, descobrimos que linguagem é interação e texto é tecido, teia, iceberg cujos segredos devem ser desvendados.

Em seus livros, somos apresentados a conceitos como cognição, discurso, interação, aprendemos a ler e compreender os sentidos do texto, a perceber diálogos possíveis com a intertextualidade, a observar a construção dos sentidos e o processo de referenciação.

Assim é nossa querida Inge: amiga, pesquisadora respeitada, professora dedicada, autora de livros essenciais na formação de profissionais de Letras e Linguística, alguém que não hesita em dizer "não sei" diante de uma pergunta, mas não demora a apontar hipóteses e sugerir bibliografia para solucionar nossos questionamentos. Ou ainda a "Dama do Texto", segundo Marcuschi (Id., ibid.).

Esta homenagem, como disse no início desta breve e singela apresentação, é mais que merecida. Digna de alguém que nos serve de exemplo e que nos ensina a cada momento, como Guimarães Rosa, que disse: "O professor é aquele que, de repente, aprende".


Rio de Janeiro, 4 de abril de 2008.

Leonor Werneck dos Santos


Fonte: www.filologia.org.br
Capturado em 21/01/2009.